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Aquém Tejo

Há quem do Tejo só veja o além porque é distância. Mas quem de Além Tejo almeja um sabor, uma fragrância, estando aquém ou além verseja, do Alentejo a substância.

Há quem do Tejo só veja o além porque é distância. Mas quem de Além Tejo almeja um sabor, uma fragrância, estando aquém ou além verseja, do Alentejo a substância.

Estória Inverosímil!

Hoje, divulga-se uma "estória inverosímel", escrita em 2011. O texto é o que foi escrito nessa data, que se mantem propositadamente. No final, constataremos e comentaremos as eventuais mudanças!...

 

O homem que queria vender o Terreiro do Paço!

 

Dona Odete, nos últimos tempos dedicada aos seus afazeres e um pouco alheada dos problemas do país, resolveu sair para espairecer e dar uma volta até à Baixa, reabrindo as suas observações sobre a Cidade onde se espelha o estado da Nação.

Resolveu apanhar o elétrico vinte e oito, tantas vezes tomado a caminho da Feira da Ladra ou da Graça e descer na Conceição cirandando até ao Terreiro do Paço, a ver o Tejo.

Já há muito não parava na Praça, apesar de por diversas vezes lá ter passado, de autocarro ou no metro, a caminho de Santa Apolónia.

Das vezes que passara de autocarro despertaram-lhe a atenção grandes cartazes colocados a toda a largura das arcadas norte, leste e oeste com mensagens escritas em três línguas diferentes: ”For Sale /Se Vende!” e ainda uma terceira parte escrita em chinês, cuja linguagem desconhecia, mas calculava significar o mesmo.

Como já observara, junto aos cartazes estavam diferentes homens sem rosto ou de rosto desconhecido, porque sempre escondidos por detrás de uma máscara, aparentemente anónimos. As máscaras, essas mudavam conforme os ciclos de vida e os dias do ano. Eram de diversas cores, mas sempre uniformes e impessoais, nada específicas, porque fabricadas em série e vendidas em qualquer loja de chineses.

De entre os diferentes homens, um destacava-se num palanque, frente ao Arco da Vitória, apregoando alto e bom som que a Praça estava à venda.

Gabava-se que já vendera o Martinho da Arcada, simbolicamente alienara a Língua, quando decidira mudar-lhe a grafia e o sentido etimológico. Já utilizava a escrita ideográfica com carateres em mandarim, para além do inglês, como segunda língua, para além da grafia e sotaque brasileiros!

Espalhados também pela Praça estavam vários cartazes bem visíveis, com uma conhecida senhora loira, com ar de tia muito simpática e um dos seus colegas, ambos a promoverem o licor beirão. Ela que, apesar de forreta, mantém sempre aquele sorriso de matrona de família, só superado pelo da sua prima Mona Lisa e o colega com ar de colegial que foi ao Louvre acompanhar a esposa artista e modelo. Rostos bem visíveis e apessoados na sua máscara de “personas” que mandam na velha Europa a desfazer-se no seu egoísmo e visão autocentrada nos umbigos. Patrocinavam a venda da Praça, a bem da Comunidade, depreendia-se pelos respetivos símbolos colocados no canto inferior direito de cada cartaz.

No centro, D. José, no seu cavalo d’Alter, continuava distraído a olhar para a “Margem Sul” à procura dum norte para se orientar na confusão a que assistia. O Marquês, no medalhão, bem gostaria de chamar aquela gente à razão, mas praticamente reduzido à escala bidimensional e incrustado aos pés do cavalo não “tugia nem mugia”, como no tempo da Dona Maria, não fosse o cavalo fazer das suas.

Nas suas andanças na Praça, Dona Odete também ficou a saber que medalhão e cavalo já estavam em vias de serem vendidos a um conhecido e mal afamado sucateiro, para os derreterem em bronze.

O “Arco da Rua Augusta”, com todo o seu simbolismo de vitória, também estava em vias de ir para a América ou então para a China, que agora dava em capitalizar vitórias, por enquanto só económicas.

Mais difícil de vender era o “buraco” do Metro, que ninguém queria por meter água na estação, depois de tantos anos a arranjar. Sempre que andava nesta linha de metro lembrava-se do que aprendera na 4ª classe, que toda a Baixa Pombalina estava assente em estacas de pinheiro, para consolidar os terrenos, solos de lamas, em parte roubados ao rio. Seria que os engenheiros projetistas e planificadores da linha não conheciam a história de Portugal?! Provavelmente não! De outro modo teriam delineado outro traçado.

E ultimamente parece ser esta a sina dos portugueses. Terem o seu destino traçado por decisores que não conhecem o mínimo de cultura humanística e especificamente da cultura portuguesa. Decisões tomadas por estrangeiros...

Se não como se explica esta obsessão pela venda da Praça tão simbolicamente representativa dos ideais iluministas, do triunfo da Razão, dos poucos monumentos grandiosos que tem a Capital na sequência do Terramoto que quase tudo levou?!

Esta obsessão pela abolição de feriados, de dias de descanso, de pausas coletivas e individuais na rotina dos dias de trabalho e da vida monótona do dia-a-dia?

Se o direito ao descanso até foi consagrado no Livro, há mais de dois mil anos, consignando esse direito inclusive como divino, pois que até Deus descansou ao sétimo dia?! Com o objetivo que mesmo os homens insensatos pudessem ler nas entrelinhas que se Deus tem direito ao descanso então os homens, à imagem e semelhança de Deus, também têm esse direito. A bem do Indivíduo e da Sociedade!

Mas voltando à Praça, que Dona Odete quando começa a filosofar, não há quem a pare…

Será que o homem vai conseguir vendê-la? Na totalidade ou em frações? Em inglês ou em francês? Numa dezena de línguas, como qualquer produto globalizado?

E será que com a venda da Praça vai conseguir pagar as dívidas?

E quem a irá comprar? E quem comprar leva o original e deixa cá uma réplica? Em esferovite? Ou fica mais um buraco no lugar da Praça?

Será que a senhora e o senhor que promovem o licor beirão acham que a queda dos países periféricos vai deixar a Europa incólume?

E com as vendas efetuadas o dinheiro arrecadado vai ser efetivamente canalizado para pagar as dívidas? Ou vai novamente sustentar a banca fraudulenta?

E com todas as medidas tomadas vamos ou não sair da crise? Ou vamos afundar-nos ainda mais?

Aguardamos para ver!

 

 

Dezembro 2011

Recebeu Menção Honrosa nos X Jogos Florais  da “Associação Cultural dos Amigos do Concelho de Avis” , em 2012.

Publicado no “Boletim Cultural” nº 108, do Círculo Nacional D’Arte e Poesia”, Outubro 2012

  

P.S. - Post Scriptum

“Estória Inverosímel”

 

Face ao observado em 2011 por Dona Odete, o que se nos oferece referir, agora, em Outubro de 2014, passados quase três anos?!

 

  • Sobre Lisboa, nalgumas zonas impressiona, tal o estado de degradação a que chegou. São prédios emblemáticos, nalguns pontos quase quarteirões inteiros a ameaçarem ruína. É só dar uma volta pela Baixa. A Praça da Figueira, a rua Augusta, a partir dos primeiros andares…! Bem sei que a responsabilidade desta situação é muito vasta… e esta degradação tem dezenas de anos. Mas com tanta gente importante que passou pela Presidência da Câmara…

 

  • Quanto à venda da Praça ela continua na praça pública e parece não ter mais fim.

 

  • O dinheiro obtido continua a não chegar para pagar as dívidas, pois que o montante de juros é sempre maior.

 

  • Quem compra, são cada vez mais estrangeiros, de modo que ter a posse e o poder de decisão de empresas de referência fora do País é hipotecar a soberania nacional no presente e no futuro. Não sei o que poderá representar caso haja algum conflito internacional futuramente! Que, infelizmente, é algo que a insensatez humana não permite descartar!

 

  • Quanto ao referir-se que os homens que vendem a Praça usam uma máscara e são “anónimos” é porque eles, de facto, são S. A. S. Q. R. – Sociedade Anónima Sem Qualquer Responsabilidade, pois nunca são responsabilizados pelo que fazem.

 

  • Quanto à Banca, depois de tudo o que aconteceu entre 2008 e 2011, termos ainda em 2014 o que se descobriu e está para descobrir sobre um Banco que era de referência, é caso para qualquer cidadão honesto perguntar: Como é possível acontecer tal situação depois de tudo o que já acontecera antes??!!!!  E não adianta, agora, quererem "branquear" a situação e alijar responsabilidades!

 

  • O “buraco” já não é de Metro. É de Kilómetro!

 

  • O Licor Beirão deixou de ser promovido por aquela senhora e aquele senhor muito simpáticos, pelo menos não se tem visto nada nesse sentido. A senhora continua a dar cartas, do senhor não sabemos o que anda a fazer...

 

  • Dos sucateiros já não reza a estória. A Justiça funcionou?

 

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