Gomorra: Série Italiana na RTP2
A saga das séries europeias continua na RTP2. E ainda bem!
Depois de séries dinamarquesas, francesas e uma espanhola, chegou a vez de uma série do país transalpino.
De nome sugestivo: Gomorra.
Remetendo-nos, pelo título, simultaneamente para dois registos trágicos.
Aparentemente para o episódio bíblico de Génesis 19, embora com um cariz diferente. Provavelmente reportando-se para a subjacente noção de castigo e expiação, face aos incomensuráveis crimes relatados no livro, no filme e, agora também na série, numa sociedade, aparentemente, sem remissão possível. Inevitável esse castigo? Improvável?! Implacável?!
“Então o Senhor fez chover enxofre e fogo do Senhor, desde os céus…”
In Génesis, 19, 24.
Prioritariamente para a sua analogia com o conceito, o modus vivendi, que de facto retrata e descreve: Camorra. Mas que não terá sido conveniente explicitar tão claramente no título da obra.
A série baseia-se no enredo do livro com o mesmo título, escrito por Roberto Saviano, em 2006. Que é uma “viagem ao império económico e ao sonho de domínio da máfia napolitana” - Camorra, onde o escritor se infiltrou como jornalista. Livro que foi vencedor do Prémio Viarregio.
E por cuja publicação foi o escritor perseguido e ameaçado de morte, tal qual Salman Rushdie. Vive em parte incerta, oculto e com escolta policial permanente.
Porque no livro chamou as coisas pelos nomes, designando os intervenientes e os locais de ação e denunciou a situação vivida especialmente no sul de Itália, mas com braços em toda a Península e tentáculos pelo mundo fora.
Apesar de no título do livro não figurar o nome exato da entidade retratada, o respetivo conteúdo explicita-o totalmente. Daí a perseguição de que o escritor ainda é alvo. A subsequente mediatização do livro, do filme e agora da série, apesar do seu sucesso, não abrandaram essa perseguição. O autor continua “jurado de morte” pela máfia napolitana, protegido por sete guarda-costas em dois carros blindados. Recentissimamente cancelou viagem ao Brasil, por não considerar ser segura essa ida.
Deste livro já fora produzido um filme com a mesma designação, em 2008, realizado por Matteo Garrone. Com vários prémios: David di Donatello, melhor filme; Satellite Awards; prémio da crítica, em Cannes.
Posteriormente o seriado, agora a passar na RTP2, na habitual 22ª hora.
“…
Íamos a caminho do Vesúvio. De súbito, surgem os vulcões com cores escuras. O Vesúvio é verde. Observando-o de longe, parece um manto infinito de musgo…”
In pag. 43, do livro citado.
“ …
E o monstro adormecido por longos anos, subitamente vomitou enxofre, expeliu terra ardente, línguas de fogo… Vociferou hiroshimas do futuro…
E do cume escorreu lava ardente pelas encostas, até ao vale. E nos céus subiu uma nuvem mortal de fumo, de pedras-pomes e cinzas incandescentes, que rapidamente se espalharam pelas planícies circundantes. Assentaram nas cidades e taparam com um manto de toneladas de um pó acre, ardente e venenoso, todas as vidas em redor.
E gases raivosos brotaram das faldas da montanha, que como que sucumbiu aos estrondos das explosões de bombas de napalm e hidrogénio, sobre a planura estendida até ao mar.
E um calor abrasador, de milhões de fogos, ardeu e queimou todo o ser vivente à sua volta.
E Pompeia e Herculano, e quantos nelas moravam, homens e animais, ficaram soterrados nos escombros dos tetos abatidos entre as paredes. E ficaram dormindo, eternamente, o sono dos justos. (…) ”
Excerto de texto apócrifo, atribuível hipoteticamente a algum dos Plínios, o Moço ou o Velho.
Mas que tem tudo isto a ver com o enredo da série?!
Pois, se puderem e quiserem fazer o favor, passe a publicidade, vejam-na!
Avaliem o nível de desumanidade de todas aquelas personagens principais. Personagens?
Leiam o livro e poderão aprofundar e ter ainda outra perspetiva mais assombrosa do respetivo enredo e conteúdo.
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