Há quem do Tejo só veja
o além porque é distância.
Mas quem de Além Tejo almeja
um sabor, uma fragrância,
estando aquém ou além verseja,
do Alentejo a substância.
Há quem do Tejo só veja
o além porque é distância.
Mas quem de Além Tejo almeja
um sabor, uma fragrância,
estando aquém ou além verseja,
do Alentejo a substância.
Nestas minhas intermitências de escritas nos blogues, outros afazeres(!), ocorre-me questionar sobre o que escrever.
Sobre o hipotético, plausível, possível, inverosímil, invisível, atentado na Faculdade de Ciências, que poderia ter ocorrido na passada sexta-feira, dia 11 de Fevereiro? Sobre tanta conversa, tanta histeria informativa, tanta verborreia supostamente noticiosa, provavelmente informativa?! Sobre tanto comentário, análise de tantos e tão variados especialistas nos assuntos centrais e colaterais, tanta especulação desinformada?! Sobre a devassa familiar de pessoas pacatas, desassossegadas por tanta barulheira comunicacional, tanto alarido descontextualizado, porque apressado?! Um plano de “ataque terrorista” tão pueril, de cinco minutos de ação e subsequente fuga no próximo autocarro?! Tantas facas e apetrechos para apenas duas mãos sós?! Adiante…
Sobre o, de facto possível, ataque de forças russas à Ucrânia?! Esta, uma situação que tanto lembra os anos imediatamente antecedentes ao início da segunda guerra mundial?
Sobre o ataque cibernético à Vodafone, que nos reporta para a fragilidade destas nossas vidas dependentes das novas tecnologias a que acedemos por um simples clique, mas de que igualmente nos podem suspender, de condições básicas de vida, também por um simples clicar?!
Dos ataques desse “bicho espertalhão” que por aí circula e nos atormenta há dois anos?
Das jogatanas de futebóis, acabando à porrada, imagem de um desporto que merece mais e melhor de todos os envolvidos? (Direções de clubes, jogadores, técnicos, árbitros, espetadores, claques, federações desportivas? Todos!)
Não! Do que eu quero falar, melhor, escrever, noticiar, é sobre algo tão simples que aconteceu ontem. Choveu! Pouco, nalguns sítios quase nada, mas choveu. E que falta a chuva faz!
Mas choveu tão pouco, que só deu para fazer uma quadra!
Cheguei ontem, ansiosa
Mal cheguei, me fui embora
Sou a água pluviosa
Faço falta a toda a hora!
P.S. – Fotos?! Estou em fase restritiva. Só uso fotos quando elas são estritamente necessárias. E, preferencialmente, apenas uma.
Bem sei que fica longe do seu percurso de Vida, Caro/a Leitor/a. Mas para quem está por perto, proporciona um passeio bem sugestivo. A fonte está lindíssima. Ademais, agora, pintada. Tem uma água ótima. Muito fresca.
Para quem está longe, proporciono esta viagem virtual. Aprecie a arquitetura, singela, mas peculiar, apelativa, tradicional.
A bacia de receção da água e de colocação dos asados, simples, mas artística!
Há sempre, em qualquer localidade, uma fonte perto, mesmo nas cidades, por maiores que sejam.
Aliás, quanto maiores e mais opulentas as urbes, mais majestosas as fontes: a Fonte Luminosa, a Fonte Monumental, a Fonte da Boneca, a Fonte dos Amores, eu sei lá… a Fonte do Ídolo… a Fontana de Trevi!
Na sua localidade qual a fonte que mais se destaca?!
Por aqui, pela Aldeia, eu evidencio esta, a Fonte do Salto! Nome original.
Aventure-se e aprecie, SFF!
Pena não poder oferecer-lhe um copo de água num cocho.
E porque temos estado a “postar” sobre atividades campestres, ainda que em meio urbano, vamos apresentar alguns aspetos peculiares e extremamente interessantes sobre algumas paisagens rurais de Aldeia da Mata.
Esta localidade do Norte Alentejano tem alguns monumentos e paisagens que merecem ser devidamente valorizados. As pessoas conhecedoras atribuir-lhes-ão o devido valor, mas muita gente não conhecerá…
Alguns monumentos serão mais destacáveis, nomeadamente dado o seu simbolismo e antiguidade, outros mais singelos e modestos, sem deixarem de ser interessantes. Uns serão mais significativos, no contexto atual, outros tê-lo-ão sido em tempos imemoriais.
De todos, num enquadramento cultural mais vasto, espacial e temporalmente, o mais significativo, também porque de maior antiguidade, será talvez a Anta do Tapadão.
A Igreja Matriz, num enquadramento cultural diverso e mais recente e, de entre os monumentos ainda em funcionamento, face aos objetivos para que foi fundada, também se destaca.
Todos estes aspetos se relativizam face ao contexto em que se inserem, no espaço e tempo próprios. Não se pretendem comparações com outros objetos de análise, de outras aldeias, vilas ou cidades. Falamos do que temos e como temos, tão somente!
De entre os monumentos que temos e também dos lugares e paisagens em que nos enquadramos, alguns são deveras interessantes.
Mais ou menos modestas, sem deixarem de ter interesse e valor, destacaria, por ex., o conjunto de fontes, de que algumas cumprem cabalmente a sua função debitando água agradável e fresca, todo o ano. Mesmo nos verões mais quentes e secos. Este ano não sei… Choveu quase nada!
Destas fontes uma se destaca entre todas. Primeiramente pela sua função primordial: a água. Será, indubitavelmente, a melhor água de entre a das diversas fontes.
Também é dotada de alguma relativa monumentalidade, na sua singeleza, de obra popular. Possui um evidente enquadramento paisagístico que a valoriza, de fráguas alcantiladas, de uma ribeira que a isola da povoação, mas a que uma ponte certamente centenária lhe permite aceder. Os penhascos, a vegetação autóctone, apesar da acácia australiana que teima em persistir e a ponte, talvez romana (?), talvez, tornam-na num passeio apetecível, apesar de atualmente pouco procurada.
Pois falo precisamente da Fonte do Salto e da Ponte do Salto.
Acede-se a ela por um caminho que durante séculos terá sido via de transporte importante para pessoas, mercadorias e animais. Atualmente até de carro.
Recentemente, por incumbência da Junta de Freguesia, foi valorizada pela limpeza da arca da água que tem na parte superior e embelezada, qual noiva, pela pintura a branco e amarelo oca, cores tão características e tradicionais na região.
Merece uma visita!
Um garrafão ou garrafa para trazer e beber água fresquinha e a caminho.
Arriba! Que se faz tarde!
E, a propósito de caminhar…
A organização de uma caminhada em que se proporcionasse a conterrâneos e forasteiros um passeio pelas fontes da Aldeia seria uma boa sugestão. Não propriamente no Verão, que está muito calor e tudo muito seco, mas na Primavera em que o enquadramento paisagístico é exemplar.
Quem fala em fontes, poderá sugestionar: “Por pontes, passadeiras e fontes…”
Bem perto da Ribeira do Salto, outro excerto da Ribeira, também agradável, é a Ribeira da Lavandeira, onde existem umas artísticas passadeiras e a que se acede por uma calçada.
Após a divulgação de cinco poesias relativas ao Alentejo, “viagens no tempo e no espaço” sobre este tema que nos é tão querido, voltamos a divulgar, conforme delineado, um texto em prosa de ficção, uma viagem no Tempo sobre História…
VIAGENS… surreais. No Tempo.
Todos os dias fazia viagens. Casa trabalho, trabalho casa. Pequenas viagens e apenas simples viagens.
Mas, naquele dia, VIAJOU real(mente). Uma verdadeira VIAGEM.
Num tempomóvel viajou. Uma viagem no Tempo.
Entrou num aparelhómetro semelhante a uma cabine telefónica das antigas. A porta fechou-se automaticamente. Carregou numa manivela… Sentiu-se estremecer por todo o corpo.
Um turbilhão de névoas em espiral… Todo o aparelho abanava, como se estivesse em convulsões.
Parou.
De repente achou-se num espaço e tempo desconhecidos.
Era um pátio enorme, cheio de água. Azul, muito azul. No meio, um estrado. Sobre ele uma mulher…
Vestido cor-de-rosa, um grande decote, por onde escorria um líquido. Azul, muito azul.
Entre mãos segurava uma cabeça, cabelo empoado, salpicado de azul.
Reconheceu-a.
Era Maria Antonieta, segurando a própria cabeça, há pouco decapitada.
Só então compreendeu que a água, o líquido azul, era o seu sangue. Azul, muito azul.
Falava. Perguntava.
- “ O meu menino?! O meu menino?!”
- “O menino está bem. Ainda há pouco dormia.” Responderam-lhe, em coro, milhões de mães, angustiadas com os seus próprios filhos.
Tranquilizou-se.
E pondo a cabeça entre um dos braços, apontou. Apontou para cima.
Num céu também azul, muito azul, estava um Sol. Um Sol – deus um Deus – sol. Muito gordo, cada vez mais gordo, uma grande cabeleira empoada, estava. Brilhando, brilhando cada vez mais, resplandecente de ouro, estava Luís XIV, o Rei. O Rei – Sol.
Todo ele era ouro. Barras de ouro, moedas de ouro. Luíses de ouro.
Ficou farto. Farto de tanto ouro, de tanto azul. Ouro e azul…
E mergulhou.
Mergulhou e achou-se numa banheira com Marat, todo ensanguentado.
Mas esse sangue era vermelho. Vermelho de sangue. Sangue de vermelho.
Experimentava, fazia experiências. Consultava manuscritos, equações e fórmulas.
Reconheceu a letra. De alguém que andara… há muito!... consigo, no Liceu.
Era de Lavoisier.
E Marat perguntou qual era a fórmula da água. Esquecera-se. E queria transformar todo aquele sangue em água. Estava farto de tanto sangue.
“H2O”, responderam-lhe milhões e milhões de vozes, de todos os injustiçados que morrem inútil e futilmente, como resultado de todas as atrocidades que os homens cúpidos de ganância e poder cometem contra os próprios irmãos de sangue.
E o narrador desta história mergulhou de novo na banheira ou piscina, não sabia… Também estava farto de sangue. Azul e agora vermelho.
E chegou ao fundo. Viu o fundo. E espantou-se!
Não era esmaltado, nem branco, nem azul. Não era vulgar, de uma banheira ou piscina normais.
O fundo era humano. Era um homem estendido, formando os contornos de uma banheira ou piscina. Enorme, gigante, espraiando-se por toda a França. Crescendo. Crescendo sempre.
Então compreendeu tudo. As ideias aclararam-se. Fez-se Luz. Mas a paisagem escureceu. Escureceu muito, fazendo-se negra, preta, preta de carvão.
Encheu-se de Terror!
Era Robespierre. Robespierre era o fudo de tudo aquilo.
Guinou. Num golpe de rins, infletiu para cima. Deixou o preto, o vermelho, o azul. Tudo sangue.
Veio à superfície.
E de novo foi banhado por todo aquele sol dourado. Daquele gordo, farto de ouro. Que nu, se banhava num cofre cheio de luíses. Luíses de ouro.
Notou que o umbigo crescia. Pouco a pouco delineavam-se contornos, formas. Uma forma única, homogénea, humana.
Nascia um homem do umbigo do rei. Um homem pequeno. Fardado, calças justinhas ao corpo. (Mas não era freak, não!) Trazia um braço metido no casaco… ou na braguilha, não se apercebeu bem.
Ah! Napoleão…
Bonaparte, nascia do umbigo do Rei – Sol!
O Tempomóvel parou. Acabara-se a viagem. Uma luzinha vermelha indicava falta de tempolina, o combustível das viagens no Tempo.
E, subitamente, o narrador regressou ao Real(mente) Presente. Que atualmente também já é Passado.
*******
Viajava, na altura, num comboio de Elvas para Lisboa, quando “escrevi” esta história sobre a História de França e quiçá da Humanidade.
******* *******
De Luíses, julgando-se Donos do Sol e de Tudo e de Todos, está o Mundo cheio.
De Robespierres potenciais e factuais está a Humanidade farta, mas eles continuam atuando por aí, agindo de forma cruel e desumana, matando indiscriminadamente, cada vez mais selvaticamente!
E Bonapartes ávidos de Fama, Glória e Poder, cada Potência tem o seu de maior ou menor envergadura! Grave e perigoso se torna quando pretendem extrapolar essas ambições a outros povos, nações, reinos e países… O século XX teve-os bem catastróficos, em maior ou menor escala, conforme os países ou nações que tutelaram!
Quanto à viagem inspiradora essa sim é irrepetível, pois cada momento é sempre único “ não é possível um Homem banhar-se duas vezes nas águas do mesmo rio”, citando o filósofo.
E contextualizando a narrativa num plano mais realista e prosaico, há que referir que já não se podem sequer realizar essas simples viagens, tão propícias à evasão, ao devaneio, à reflexão, como eram as viagens de comboio…
Pois, muito prosaicamente, já não circulam comboios de passageiros na Linha de Leste, espaço e tempo em que, em viagem, em movimento, esta história foi surgindo.
Só mesmo viajando no tempo e vogando na imaginação.
Notas Finais:
Esta história, inspirada na História de França, foi escrita nos inícios da década de 80, julgo que em 1982.
Foi publicada no JL – Jornal de Letras, Nº 212, Ano VI, 28/07/1986, na rubrica “A Prova dos Novos”, sob pseudónimo: “Zé Manel (Mata)”.
O enquadramento da história foi adaptado, nas explicações iniciais e finais. Na versão inicial era ligeiramente diferente. Também o papel e ação do narrador foram modificados.
Quando já tenho o tema tratado e organizado para publicação, 4ª feira, 07/Jan., por trágica ironia, tenho conhecimento da ocorrência, na capital francesa, dos bárbaros e desumanos atentados, amplamente noticiados. A barbárie, a crueldade, a insanidade, a insensatez humanas, continuam desenfreadas…assassinando inocentes. Quase todos os dias, pelos mais diversos locais da Terra, a sanha assassina abate-se sobre homens, mulheres, crianças, jovens, velhos, adultos, indiscriminadamente, civis que nada têm a ver com as guerras que se eternizam pelos mais diversos locais da Terra!
É a 2ª vez que, quando preparo um post para o blog, em que um país é de algum modo mencionado, acontecem situações problemáticas nesse País. Já sucedera relativamente a Timor!
De qualquer modo divulgo esta história como tinha projetado, isto é, após a publicação da poesia “Alentejo”, também de 1982 e dos quatro poemas escritos em 1988, sobre quatro dos cinco sentidos, reportando-me a idêntica temática “Alentejo”: “Cores…, Sons…, Cheiros…, Mãos…”. Um 5º tema, versando “Sabores..”, nunca chegou a ser escrito…
Continuo dando seguimento ao projeto idealizado: ir divulgando a poesia já publicada, modalidade sobre que me tenho debruçado mais, intervalando com textos em prosa de ficção também já publicados.
Seguidamente tentarei criar um texto novo sobre uma temática atual…
Aguarde para ler!
Uma NOTA FINAL:
No concernente às fotos, e dado o tema versado, foram todas retiradas da net: wikipédia, enciclopédia livre.
As imagens são apenas uma sugestão para os subtemas. O ideal era ter imagens originais diretamente relacionadas…
Divulgamos hoje o nosso post nº 50. Que é também o 1º trabalho que colocamos em 2015. E, como não podia deixar de ser, pois também é esse o nosso propósito, damos a conhecer neste enquadramento uma poesia sobre o nosso Alentejo.
Este conjunto de vinte e seis quadras foi escrito em 1982, numa época em que trabalhava no Alentejo e resultaram da observação poética da planície transtagana nessa altura. Alguns aspetos ter-se-ão modificado. Atualmente há realidades que, à data, eram ainda ficção científica. De qualquer modo é um flash desse tempo nesse espaço, que nos é tão querido e idealizado.
ALENTEJO
Horizontes infinitos
Extensões de montados
Manchas de olivais bonitos
No meio, campos lavrados.
Campos a perder de vista
Vista do cimo do monte
Altaneiro como crista.
No vale, a horta e a fonte.
Montes quase abandonados
Sem caseiro nem patrão
Pois carros motorizados
A casa trazem o aldeão.
Casas de branco caiadas
Barras azuis e amarelas
Cheias de esmero, asseadas
Alegra os olhos vê-las.
Rasteiras, bem alinhadas
De quando em vez solarengas
Varandas, janelas bordadas
Casas, nossas avoengas.
Chaminés de sol e lua
Portas de cantaria
Abrindo a casa à rua
Dão beleza à frontaria.
Ruas de casas juntinhas
Fazem terras afastadas.
De noite é ver as luzinhas
Dar vida à planura, encantadas.
De dia banhadas pelo sol
Alegria e tormento
A brancura dum lençol
A secar na planície, ao vento.
Do Alentejo aldeias
De gente calma e fagueira
Amiga de trocar ideias
Embora nem sempre à primeira.
Gente mais moça abalando
P’ra Lisboa e outras bandas.
Os mais velhos vão ficando
Até que Deus queira, em bolandas.
Pela manhã, o Destino
Os leva à soalheira
Aquecer sangue latino
Que já falta companheira.
Durante a manhã, as comadres
Dominam as ruas mercando
E estando fora os compadres
Com as amigas vão conversando.
À tarde e à noitinha
Após um dia de trabalho
Homens enchem a tendinha
Causa de brigas e ralho.
Mas após tanta fadiga
No campo, a maioria
Faz bem beber uma pinga
Dá esquecimento e alegria.
Terminar a cavaqueira
Que à janta a mulher chamou.
Esperar sentado à lareira
Que a novela começou.
Migas, açorda e mais
Sopa de cachola e tomate
De miolos, gaspacho, é demais
Tanto pão e tanta arte.
Hoje não é tanto assim
Comida vai variando.
Borba, Redondo, enfim
Rico tinto acompanhando.
Após a janta, o descanso
Que amanhã é de trabalho.
Antes, um breve remanso
Aquecendo-se ao borralho.
De manhã o sol levanta
Trabalhador para a jornada.
Dantes a pé, agora espanta
A quem tem motorizada.
Lavoura, azeitona e cortiça
São trabalhos desde outrora.
Conforme a época, a liça
Novas culturas agora.
O tomate, o girassol
Culturas de regadio.
As barragens são um rol
Mas não chegam p’ró sequio.
Os serviços na cidade
Algumas indústrias também.
Desemprego, ansiedade
De quem quer algum vintém.
Pau bucho, chifres, cabaças
Argila, pedrinhas e linho
Nelas, flores e sonhos traças
Objetos de amor e carinho.
Trabalho feito com as mãos
Na cortiça, ferro ou barro.
Homens de arte, artesãos
Ourives de bilha e tarro.
Mas artistas todos são
De pincel ou de trator
Na tela ou terra chão.
Basta trabalhar com amor.
Amor que a nós, Homens, une
E à terra que nos viu nascer.
Mais nos liga que nos desune
Todos juntos a conviver.
Escrito nos inícios de 1982.
Publicado na VII Antologia do Círculo Nacional D’Arte e Poesia, 2003.
E como, apesar de termos hoje mais um dia de chuva, um copo de água sabe sempre bem e refresca as ideias. E também não vamos colocar a rapariga, pois que de uma rapariga se trata, não a vamos colocar a pedir um copo de vinho!
Lembramos ainda que a ação decorrente da narrativa se situa num outro tempo, tanto cronológico como meteorológico. Por tudo isso segue:
Capítulo II
Saiu então ela, Odete, da Livraria, agitando a nota de cinco mil escudos, ainda por destrocar. Mas precisava urgentemente de dinheiro mais miúdo.
Pensou ir ao Café, tomar uma bebida, entregar a nota e assim eram obrigados a dar-lhe troco. Acabou por entrar na primeira Tasca da Esquina e dirigiu-se ao balcão, pedindo uma garrafa de agá, dois, ó, do Luso.
- Menina, não sabe que o H não se lê?! E andam vocês a estudar, não sei para quê…
Não obtendo resposta, o taberneiro continuou:
- Então, porque o pronunciou?! Além do mais não percebo por que razão o Acordo Ortográfico não baniu completamente essa letra. Não faz falta nenhuma, só dá mais trabalho e gasta mais carga de esferográfica e tinta e ocupa espaço na folha. A menina quererá certamente… dois. Oh, tu que és do Luso, traz aí… Mas, menina, quer dois de quê?? Dois maços de tabaco, já se vê. Já fuma?! Tão novinha! Não sabe que o tabaco mata?! Mas, enfim, aqui tem dois maços de tabaco SG, já se vê, mais uns pregos para o seu caixão. Pagamento no ato de compra, do tabaco, não do caixão, que esse pode ser pago a prestações.
- Pagar com cinco mil escudos? Isto aqui não é nenhum antiquário. Parece que regressou você da Guerra dos Cem Anos, com tantos escudos. Cinco mil!!! Bem podia ter trazido uns euros, se vem lá dessas Europas… Além do mais, hoje em dia, na era das bombas e dos mísseis não há escudos que nos protejam, tal o arsenal de destruição que se acumula por esse mundo fora. E já ninguém quer os escudos, nem os espanhóis desde a Batalha de Aljubarrota, só mesmo Dom Quixote… agora é tudo em euros, ou dólares.
- Olhe, menina, não lhe vendo o tabaco, pois não tenho troco para tanto escudo. Ainda mal comecei o dia, não tenho quase nada na caixa.
Ela que assistira, impávida e serena, a todo este arrazoado de conversa, explodiu.
- Não, não tem nada na caixa, não! Nem na caixa nem no caixote. Tem a caixa dos pirolitos desregulada e o caixote todo desaparafusado. Seu caixote despregado!
E preparava-se para sair.
- Espere aí, menina, que também leva troco.
Voltou-se a rapariga, admirada por, de repente, o taberneiro já ter dinheiro na caixa para lhe dar troco, quando este lhe devolve o impropério figurado, atirando-lhe a água dum copo que enchia para um cliente que lhe pedira uma água sem gás.
- Toma lá um refresco para essas ideias tontas. Imagine-se pronunciar o agá. Onde já se viu?! Só mesmo para quem quer ofender um quase analfabeto como eu.
Com os cabelos escorrendo, realçando o cheiro a camomila do shampoo, xampô, sem h, ultra suave, que costumava usar, quedou-se um pouco, meditando sobre algumas questões de Química que a preocupavam. Se tivesse boa nota, nesta disciplina, melhorariam as hipóteses de entrar na Universidade. Oxalá saíssem muitos problemas, porque na Matemática estava ela bem. Ou não, H2O?!
Mais uma Nota!
Uma versão deste texto foi publicada no Boletim Cultural Nº 71, do Círculo Nacional D'Arte e Poesia, Ano XVI, Fev. 2005.