Há quem do Tejo só veja
o além porque é distância.
Mas quem de Além Tejo almeja
um sabor, uma fragrância,
estando aquém ou além verseja,
do Alentejo a substância.
Há quem do Tejo só veja
o além porque é distância.
Mas quem de Além Tejo almeja
um sabor, uma fragrância,
estando aquém ou além verseja,
do Alentejo a substância.
Apesar do novo "estardalhaço" que por aí anda com mais um "caso mediático", quantos já tivémos este ano? E onde vamos parar com este descalabro todo?! Pois apesar de tudo isso vamos continuar a "postar" mais um texto sobre as aventuras da menina Odete, de "estórias que parecem mentiras". Pois, até pode parecer mentira que nos mostremos relativamente alheios ao imediatismo das notícias...
Pois! Mas este excerto também é sobre notas, notas, notas, as notas é que motivam isto tudo, tal é a ambição, a cupidez do ser humano! De alguns seres humanos, diga-se...
Notas e moedas...
F.M.C.L.
Só que a menina Odete andava, na altura, preocupada com o "destrocar a nota de cinco contos", mas também com a nota de Matemática. A ação decorreria com o aproximar do final do ano letivo, certamente.
Capítulo III
Subindo a Avenida, encontrou o professor de Matemática que descia apressado. Pasta na mão, contendo um portátil, camisa desapertada, gravata ligeiramente deslaçada, casaco aos ombros, do fato de meia estação que usava, dirigia-se ao gabinete de arquitetos onde participava, em equipa, na elaboração de projetos de construção. (Melhor, de destruição! Tipo deita abaixo “arte nova” e faz torre de vidro refletor.)
- Setôr, você é que me vai desenrascar com esta nota.
- Ah, não me venha com conversas que estou cheio de pressas. (Pressa de chegar ao gabinete para a reunião, pressa que acabe a reunião, pressa de chegar a casa, pressa de acabar o dia e ir descansar, pressa de terminar o ano e virem as férias, pressa… pressa. Pressa da pressa…) E já dei a nota que havia de dar. Não faço alterações. Tem o que merece e até tem uma nota muito boa, não me diga que ainda queria melhor! Nas provas de ingresso terá oportunidade de melhorar. Se toda a gente tivesse as suas notas!..
- Setôr, não é bem isso…
- Pois, pois… depois falamos. Já estou mais que em cima da hora da reunião. (imaginava os colegas todos em volta da mesa, prontos para reunirem e ele a entrar, mesmo em cima da hora, a pisar a hora, a pisar o risco, a pedir desculpa, faz favor de dar licença, desculpe, por favor, até chegar ao seu lugar para se sentar…) desculpe, senão vou chegar atrasado… até à próxima, adeus. Há Deus?!
Acrescentaria: Há Justiça?! Há Justiça Divina?!
Nota de rodapé:
Uma versão deste texto foi publicada no Boletim Cultural nº 82 do Círculo Nacional D'Arte e Poesia, Ano XVIII, Maio 2007
E como, apesar de termos hoje mais um dia de chuva, um copo de água sabe sempre bem e refresca as ideias. E também não vamos colocar a rapariga, pois que de uma rapariga se trata, não a vamos colocar a pedir um copo de vinho!
Lembramos ainda que a ação decorrente da narrativa se situa num outro tempo, tanto cronológico como meteorológico. Por tudo isso segue:
Capítulo II
Saiu então ela, Odete, da Livraria, agitando a nota de cinco mil escudos, ainda por destrocar. Mas precisava urgentemente de dinheiro mais miúdo.
Pensou ir ao Café, tomar uma bebida, entregar a nota e assim eram obrigados a dar-lhe troco. Acabou por entrar na primeira Tasca da Esquina e dirigiu-se ao balcão, pedindo uma garrafa de agá, dois, ó, do Luso.
- Menina, não sabe que o H não se lê?! E andam vocês a estudar, não sei para quê…
Não obtendo resposta, o taberneiro continuou:
- Então, porque o pronunciou?! Além do mais não percebo por que razão o Acordo Ortográfico não baniu completamente essa letra. Não faz falta nenhuma, só dá mais trabalho e gasta mais carga de esferográfica e tinta e ocupa espaço na folha. A menina quererá certamente… dois. Oh, tu que és do Luso, traz aí… Mas, menina, quer dois de quê?? Dois maços de tabaco, já se vê. Já fuma?! Tão novinha! Não sabe que o tabaco mata?! Mas, enfim, aqui tem dois maços de tabaco SG, já se vê, mais uns pregos para o seu caixão. Pagamento no ato de compra, do tabaco, não do caixão, que esse pode ser pago a prestações.
- Pagar com cinco mil escudos? Isto aqui não é nenhum antiquário. Parece que regressou você da Guerra dos Cem Anos, com tantos escudos. Cinco mil!!! Bem podia ter trazido uns euros, se vem lá dessas Europas… Além do mais, hoje em dia, na era das bombas e dos mísseis não há escudos que nos protejam, tal o arsenal de destruição que se acumula por esse mundo fora. E já ninguém quer os escudos, nem os espanhóis desde a Batalha de Aljubarrota, só mesmo Dom Quixote… agora é tudo em euros, ou dólares.
- Olhe, menina, não lhe vendo o tabaco, pois não tenho troco para tanto escudo. Ainda mal comecei o dia, não tenho quase nada na caixa.
Ela que assistira, impávida e serena, a todo este arrazoado de conversa, explodiu.
- Não, não tem nada na caixa, não! Nem na caixa nem no caixote. Tem a caixa dos pirolitos desregulada e o caixote todo desaparafusado. Seu caixote despregado!
E preparava-se para sair.
- Espere aí, menina, que também leva troco.
Voltou-se a rapariga, admirada por, de repente, o taberneiro já ter dinheiro na caixa para lhe dar troco, quando este lhe devolve o impropério figurado, atirando-lhe a água dum copo que enchia para um cliente que lhe pedira uma água sem gás.
- Toma lá um refresco para essas ideias tontas. Imagine-se pronunciar o agá. Onde já se viu?! Só mesmo para quem quer ofender um quase analfabeto como eu.
Com os cabelos escorrendo, realçando o cheiro a camomila do shampoo, xampô, sem h, ultra suave, que costumava usar, quedou-se um pouco, meditando sobre algumas questões de Química que a preocupavam. Se tivesse boa nota, nesta disciplina, melhorariam as hipóteses de entrar na Universidade. Oxalá saíssem muitos problemas, porque na Matemática estava ela bem. Ou não, H2O?!
Mais uma Nota!
Uma versão deste texto foi publicada no Boletim Cultural Nº 71, do Círculo Nacional D'Arte e Poesia, Ano XVI, Fev. 2005.
Odete entrou na “Livraria Portugal” e, dirigindo-se ao empregado, perguntou:
- Pode destrocar-me cinco contos, se faz favor?!.…
- Depende dos contos que quiser, respondeu-lhe o empregado da Livraria.
- Ora, destroque-me cinco contos, mas como lhe der mais jeito. Podem ser de quinhentos ou de mil…
- Já que quer de Mil, ainda tenho das “Mil e uma Noites”, em banda desenhada… Bom! De Quinhentos não há. Ah! Talvez se arranje… Ali Babá e os Quinhentos Ladrões. Como quer cinco, aconselho o da “Carochinha” o do “Tourinho Azul” e… porque não?! O do “Capuchinho Vermelho”. Sempre é bom prevenir, não é?! Nunca se sabe os maus encontros que se podem ter.
- Não é desses contos que quero, mas em notas, retorquiu Odete.
- Alguns têm notas, há-os até bem anotados. Um deles, que é uma análise dos contos de fadas, está cheio de anotações. Já sei! Quer uma obra mais intelectual, com muita bibliografia e referências a outros livros de consulta… talvez, peut-être…
- Não quero dos seus contos ou notas. Nem talvezes ou pó d’éter. E não estou doente para ir à consulta… ao médico. Sugiro…
- Não me chame Sugiro, não sou nenhum japonês. Fui nascido e criado em Alfama, João Amaral, de meu nome.
- Dane-se! Vá dar uma curva, vá ver se chove. Vá ao outro lado! Respondeu-lhe, exaltada, Odete.
O empregado da “Livraria Portugal” deu meia volta, olhou para o outro lado, mas não viu nada de especial. Nem sequer estava a chover!
E Odete saiu, com a nota de cinco contos na mão, apressada em destrocá-la, antes da chegada do euro. Do Euro, dinheiro, não do Euro, futebol, duas entidades afinal tão interligadas, mas que aqui convém destrinçar.
Nota: Um versão deste texto foi publicada no Boletim Cultural Nº 69 do Círculo Nacional D'Arte e Poesia, Ano XV, Outubro 2004.
Esta é uma imagem extraída de "https://www.forum-numismatica.com."
Provavelmente seria uma nota idêntica a esta que a menina Odete andava a tentar destrocar.
No dia 4 de Outubro, aconteceu magia e encanto em duas coletividades de cultura e recreio na novel freguesia do Laranjeiro - Feijó: O Encontro de Coros, no CIRL – Clube de Instrução e Recreio do Laranjeiro, comemorativo do 29º aniversário da Freguesia do Laranjeiro e o 4º Serão de Cante e Poesia Alentejana – “O Cante a Património Imaterial da Humanidade, UNESCO”, no salão de festas do CRF – Clube Recreativo do Feijó.
No 1º evento, ocorrido pelas 16 h, participaram: Coro Polifónico do Clube do Sargento da Armada, Coro Polifónico “Carpe Diem”, Grupo de Cantares Vozes na Idade de Ouro e Coro Coral Stravaganza, dirigidos pelos respetivos maestros. Cantaram e encantaram cada grupo a seu modo e seu saber, modas populares, tradicionais e clássicas, tendo cantado, no final, sem ensaio prévio, “Acordai” de Lopes Graça, dirigidos pelo maestro Edgar Saramago. Épico, acutilante e atual. Belas melodias e belas vozes proporcionaram uma tarde de salutar deleite espiritual, como só a audição de lindas músicas e canções pode proporcionar!
À noite, pelas 21h, iniciou-se o segundo evento: Serão de Cante e Poesia. Participou o Grupo Coral e Etnográfico Amigos do Alentejo do Feijó, grupo anfitrião e organizador, o Grupo Coral da Adega da Vidigueira, o Grupo Coral Os Reformados de Ferreira do Alentejo, O Grupo Coral Os Alentejanos da Damaia e o Grupo Coral Os Bubedanas de Beja. Em Poesia enlevou-nos o Poeta César Salvado. Relativamente à Poetisa Rosa Dias também prevista de atuar, a Organização informou que não compareceria, por estar doente. (Votos de boas melhoras!)
No salão de festas do CRF, repleto, num palco tendo como cenário a projeção de uma paisagem alentejana, destacando-se um sobreiro, uma carroça e uma seara, atuaram os cinco grupos entremeados pelas prestações poéticas.
Parabéns a todos os intervenientes, muitos deslocando-se centenas de quilómetros, atuando por amor à arte, a troco de nada material, lutando com nobreza e galhardia por um ideal, oferecendo os seus préstimos a uma comunidade de ouvintes e amantes do Cante.
Ouviu-se o murmúrio do vento nos trigais de antanho, viu-se o ondular das searas e das ondas do mar distante, escutou-se o balir dos rebanhos ausentes, o marulhar forte e agitado das águas em tempestade, as vozes telúricas das profundezas do mundo e entranhas da terra, o sussurrar doce e meigo da palavra amor num ouvido de mulher… Esteve ali vincada e majestosa a força da terra transtagana! A Alma de um Povo e de uma Cultura, a força do coletivo, da coesão de grupo, que não se deixa amordaçar por modas e consumismos estereotipados.
Em contraponto, de forma sempre atuante e oportuna, interveio o Poeta. Talento, mestria, saber, intuição e improvisação, sabedoria e estética, mas também força, intervenção e verdade nua e crua, disse excecionalmente poemas seus e de Ary dos Santos, tendo terminado, de forma brilhante, com “Soneto Presente”.
O último grupo atuante tem um nome que, à priori, não nos remeterá para a qualidade que ostenta e encerra na juventude dos seus componentes. Estavam apenas oito rapazes muito jovens, mas como referiram se iam esforçar para valerem por quarenta. E valeram, mas mais que isso. Valeram por oitenta! Tal a força, a energia, a garra com que agarram as modas. Modas em que conciliam a tradição e a modernidade, que bem apresentam inclusive no trajar.
Todos os grupos mereceram aplausos rasgados do público que desse modo não regateou encómios a nenhum dos participantes e que foram amplamente merecidos.
Parabéns também e especialmente à organização do evento, ao grupo anfitrião e seus elementos, às entidades autárquicas do concelho de Almada, que tão bem sabem acarinhar a Cultura, nas suas mais diversas manifestações artísticas e desportivas.
E também parabéns aos espetadores, pois nos momentos de intervenção dos artistas o silêncio era absoluto, quase religioso, mágico. Bem sei que esta atitude é um dever! Mas, por vezes…
E não resisto a questionar, como já fiz noutras ocasiões e também ouvi da voz do Srº Afonso, da Organização:
Que fazem as TVs portuguesas que deixam passar estes acontecimentos?
Nota:
Publicado em:
Boletim Cultural Nº 117 do Círculo Nacional D'Arte e Poesia, Ano XXV, Out. 2014
Boletim Informativo e Cultural Nº 69 de Associação Portuguesa de Poetas - Out./Nov./Dez. - 2014