Há quem do Tejo só veja
o além porque é distância.
Mas quem de Além Tejo almeja
um sabor, uma fragrância,
estando aquém ou além verseja,
do Alentejo a substância.
Há quem do Tejo só veja
o além porque é distância.
Mas quem de Além Tejo almeja
um sabor, uma fragrância,
estando aquém ou além verseja,
do Alentejo a substância.
Do PS, recebi carta manuscrita do Deputado Miranda Calha, datada de 27/3/90.
Excertos:
«Recebi, e agradeço… Infelizmente a realidade é tal como a conta.
…Já me pronunciei diversas vezes na Assembleia sobre este assunto gravoso para o meu distrito e que o actual governo nunca respondeu às questões colocadas. Continuarei… a lutar para que no distrito de Portalegre existam melhores condições de deslocação – especialmente no sector respeitante à C.P. (…)
Os melhores cumprimentos
Júlio Miranda Calha»
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Por curiosidade, apresento foto da carta.
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Do Grupo Parlamentar do PCP, responderam a 8 de Março de 1990, através do Gabinete de Apoio, em nome do Deputado Luís Roque, que agradece. Enviam uma “cópia de intervenção proferida em Plenário, sobre o assunto”.
É um texto de 4 páginas, da “Intervenção do Deputado Luís Roque – PCP, Sessão Plenária do Dia 9 de Janeiro de 1990 – PAOD”
Apresento alguns excertos da intervenção:
«Sr. Presidente
Srs. Deputados,
Resolveu o C.G. da CP encerrar ao tráfego de passageiros a partir de 1 de Janeiro de 1990 mais nove ramais ferroviários, a saber Valença/Monção, Vila Real/Chaves, Amarante/Arco de Baúlhe, Sernada/Viseu, Évora/Reguengos de Monsaraz, Évora/Estremoz/Vila Viçosa, Estremoz/Portalegre, Beja/Moura e o Ramal de Sines.
É de salientar que anteriormente já haviam sido encerrados a Linha do Dão e o troço Pocinho/Barca de Alva.
Esta decisão, concerteza concertada com o Ministério da Tutela, corta às regiões mais interiores o cordão umbilical que as ligava às regiões mais desenvolvidas do litoral, agravando mais ainda a assimetria litoral/interior, que hoje já é gritante.
(…)
…a CP e o Governo demonstram à saciedade quanto estão preocupados com o desenvolvimento económico e social do interior.
Em intervenção por mim aqui proferida em Maio de 88, aquando da implementação dos novos horários de Verão, prevíamos que o desajustamento dos mesmos em relação aos interesses dos utentes visava degradar a oferta com o fim de mais facilmente proceder aos encerramentos programados.
Para os incrédulos de então, aí está a resposta do Governo e da CP.
Estes planos visam o encerramento de 1000 Km de via e mais de 300 estações, ficando a rede ferroviária nacional reduzida ao eixo Braga/Lisboa/Faro, às ligações com Espanha e aos suburbanos de Lisboa, Porto e Coimbra.
Repare-se que no plano de modernização e reconversão dos caminhos de ferro (1988/1994), aprovado em Conselho de Ministros em Janeiro de 88, a rede secundária com 1076 Km absorve apenas 0,2% do total do investimento previsto no plano.
Este valor denuncia claramente quais são as intenções do Governo e da CP em relação a estas linhas, ou seja, encerrá-las.
O Governo com esta medida gravosa para as populações esquece um princípio que é aceite em todos os países comunitários, a função social do transporte de passageiros. (…)»
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NOTAS Finais:
Os outros partidos da Assembleia não responderam.
Da Câmara Municipal de Portalegre também não recebi resposta.
O “Jornal Fonte Nova” publicou o texto.
O “Jornal Expresso” não fez referência ao assunto.
(Os negritos são de minha lavra.
Apresento os excertos que considerei mais relevantes.
Estes textos, traduzindo intervenções e tomadas de posição, mostram o posicionamento destes partidos face à situação.
São documentais. Fazem parte da nossa pequena história pessoal, pois vivemos esses tempos de viagens de comboio. Farão ou não parte da Grande História do nosso País. Para todos os efeitos os comboios fazem parte da História de Portugal.
Para se entender o historial dessa desativação dos comboios e subsequentes (re)utilizações ou abandonos, a leitura do livro já referido é fundamental.
“Pelas Linhas da Nostalgia – Passeios a Pé nas Vias Férreas Abandonadas”,de Rui Cardoso e Mafalda César Machado, Edições Afrontamento, Novembro de 2008.
E ainda haveremos de ir a Barca D'Alva?!
(A foto que titula o postal é de uma Amendoeira. Mas não de Barca D'Alva. Esta é de Palmela. Hei-de postar sobre ela!)
Boas Leituras! Muita Saúde. Boas Viagens, de Comboio. Muito Obrigado!
Respostas das Entidades, para quem enviei o texto publicado nos postais anteriores, acompanhado de uma carta específica para cada uma delas.
CP - Caminhos de Ferro Portugueses, E.P. - enviei carta a 90/02/01, para a Administração.
Resposta textual obtida da CP, datada de 90/02/23:
“Analisamos com muito interesse o relato enviado por V. Exª, que agradecemos.
Apresentamos as nossas desculpas pelos inconvenientes surgidos, originados sobretudo por avarias de material motor e pela necessidade de conceder enlace a passageiros vindos do Norte com destino ao Leste, que de outro modo se veriam obrigados a esperas muito mais longas.
Quanto à utilização de Automotoras Nohab, tal facto deve-se a necessidades de rentabilização do material disponível e das condições de exploração.
Esperando poder voltar a contar com V. Exª entre os nossos clientes, apresentamos os nossos melhores cumprimentos.”
Rubricado por: “O Director de Operações Sul”
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Assembleia da República
Para a Assembleia da República também enviei o texto. (Consultando a Wikipédia, à data, a composição da Assembleia seria como segue: PSD, PS, CDU, PRD, CDS. O Primeiro-Ministro era o Professor Doutor Cavaco Silva.) Não me lembro se enviei especificamente para cada grupo parlamentar, se genericamente para a Assembleia.
O texto enviado foi acompanhado pela carta seguinte, também com a data de 90/2/1:
«Excelentíssimo Senhor Deputado
Tomo a liberdade de me dirigir a Vossa Excelência, na qualidade de eleitor do distrito de Portalegre, no sentido de referir, através duma ocorrência factual, um assunto que vem problematizando muitos dos habitantes do distrito, mais concretamente a situação dos comboios. Não tenho, todavia, a pretensão de abordar o tema duma forma exaustiva, outros já o fizeram melhor.
Segue, em anexo, um texto testemunhando o ocorrido, acompanhado de algumas questões – reflexões sobre o tema e outros, que aparentemente díspares, a ele estarão bastante ligados, pelo agravamento da interioridade do Distrito.
Agradecendo a atenção prestada
Subscrevo-me de Vossa Excelência»
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Caro/a Leitor/a, acha que recebi respostas de todos os grupos parlamentares?!
A resposta a esta pergunta só a poderei dar em próximo capítulo deste “Folhetim do Comboio de 1990”!
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(P.S. - A foto? Original. De Rosas do meu Quintal. É de uma Roseira que trouxe do Apeadeiro da Mata, local de chegada da narrativa deste folhetim "Viagemde comboioem 1990". Local também de partida para as muitas viagens que fiz de comboio, nos anos setenta, oitenta e inícios de noventa, do séc. XX. Estava junto à casa da guarda da passagem de nível. Daí, colhi um ramo que abacelei. E aí virá a Primavera em que florescerá novamente, em todo o seu esplendor. E que venha a Primavera e que traga chuva. Que o Inverno só nos tem trazido frio. Muita Saúde e muito Obrigado.)
«Algumas pessoas comentavam que os dias de azar não são só as 6ªs feiras, mas como não sou de superstições, antes acredito que o futuro é fundamentalmente construído por nós próprios, gostaria de deixar algumas questões em aberto, à consideração de quem de direito e obrigação, sem pretensões a esgotar o assunto:
1 – Se, numa mesma viagem, há três avarias com três máquinas diferentes, será que estas, à saída das oficinas, estavam em condições para circulação?
2 – Ninguém prevê ou se preocupa com a eventualidade de possíveis acidentes a ocorrer, dadas as precárias condições de segurança em que se viaja? A memória é assim tão curta?
3 – Os tão propagandeados meios técnicos, a implantar nos comboios e que permitiriam uma resolução mais rápida de eventualidades como as descritas, continuam apenas a ser lembrados na altura dos acidentes? Depois são rapidamente esquecidos?
4 – Quando tanto se fala em investimento e progresso que, na Linha do Leste, em 1990, parece escrever-se RETROCESSO, será que ainda aqui veremos circular as máquinas a vapor? Estamos no Ano Europeu do Turismo!
5 – Será que teremos que passar a levar auscultadores para suportar o barulho da automotora? (Ou a CP passa a fornecê-los no acto de compra do bilhete?)
6.1. – Será que o objectivo das medidas recentemente tomadas (a extinção de certos ramais, acrescente-se também) pretende afastar os passageiros da utilização dos comboios como meio de transporte?
6.2. – Mas onde foram criadas alternativas válidas para muitas populações do Interior? Onde estão as boas estradas? Onde estão os bons meios de transporte rodoviários?
6.3. – Será de facto economicamente mais rentável, para o país, transportar passageiros por camioneta do que pelo comboio?
6.4. – Servindo-se das estruturas já existentes, não haverá modalidades de transporte ferroviário mais económicas do que as utilizadas?
(Supondo que será essa a razão principal da supressão de muitas das vias férreas.)
7 – Em suma, pretender-se-á, a longo prazo, uma ainda maior desertificação do Interior e um congestionamento e macrocefalia dos grandes centros urbanos?
8 – Será que o Interior está fatalmente destinado à florestação eucaliptal acompanhando a fuga das populações campesinas?
9 – Julgar-se-á que a actual divisão especializada das economias periféricas europeias e a respectiva superestrutura é eterna? Isto é, pensar-se-á que a estrutura da CEE é imutável e perene e que nós vamos ter sempre quem nos forneça muitos dos produtos que consumimos e injecções de capital financeiro para os adquirir?
Será que a nossa pasta de papel vai ser eternamente necessária nos países industrializados?!
Será que …? Será…?
Talvez sejam questões a que nós não mereçamos resposta… Talvez!»
Cova da Piedade / Lx, finais de Janeiro de 1990
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Estas foram as questões e considerações que formulei e enviei às Entidades com competências no assunto, juntamente com o texto descritivo da ocorrência.
(Valem o que valem, face ao contexto em que se inscrevem, ao tempo a que se reportam, e à importância de defender o Interior, sempre tão esquecido, há várias décadas.)
Enviei este texto completo, (sem negritos, estruturados para efeitos de blogue), para CP, para Assembleia da República, para Câmara Municipal de Portalegre, para Jornal “Fonte Nova”, para Jornal “Expresso”.
(Abordarei as respostas obtidas em próximo postal.
O/A Caro/a Leitor/a dirá que isto já parece um folhetim. E com razão, reconheço. Obrigado!)
Nas fotos dos postaisanteriores, e neste, pudemos e podemos observar as mudanças na fisionomia da Amoreira da Barca D’Alva. Na foto anterior, quase, quase no Inverno, a árvore está praticamente despida de folhagem. Agora, já em plena estação, estará completamente desprovida das folhas. Que estarão, maioritariamente, atapetando o chão, decompondo-se em matéria orgânica, carbono e outros elementos minerais, que as chuvas transportarão às raízes, nutrindo e abastecendo a planta.
Em Maio, em pleno e “maduro Maio”, chegará a vez de ser a Amoreira a alimentar outros seres vivos. Carregadinha de frutos, “amoras de pau”, é um maná para a passarada. Melros, vestidos de preto acetinado, bico amarelo, os machos; em voo rápido e fugaz, são um constante ir e vir, abastecendo-se dos saborosos frutos pretos. Estorninhos vão numa revoada, este passaredo em bandos, pousando nos ramos, debicando amoras. Outras aves, de menor porte, cujo nome desconheço, também visitam a secção da frutaria deste supermercado gratuito. Dá gosto ver! E ainda mais ouvir a chilreada. Ademais os rouxinóis com o seu melodioso cantar! (Gravei vídeos, mas ainda não sei transpô-los para o blogue! Adiante…)
E assim esta Árvore cumpre um dos seus papéis. Alimenta passarolos, passarinhos e passarocos, e estes também cumprirão a função que o vegetal lhes destina. Comendo as amoras, espalharão as sementes da árvore, nos mais diversos locais da campina.
Mas como chegou esta planta da Barca D’Alva ao Alentejo?!
Não veio por semente, não foram os passarolos que a trouxeram. Também não foram as cegonhas! Veio de comboio. Mas não como árvore completa, com tronco, raiz e folhas.
Veio apenas um pedaço de um ramo, aliás dois ou três pedaços de ramos, que abacelei no quintal, em 1979. Passados dois ou três anos, o ramo que vingou, criando raízes e folhas, transplantei-o para o “Vale de Baixo”, bem no início dos anos oitenta, do século XX. E aí está a Amoreira, provinda da Estação de comboio da Barca D’Alva, um clone de árvore que por lá estava à data. Ainda por lá haverá alguma Amoreira?!
Mas faltam fios no novelo desta história…
Em 1979, trabalhava no Norte de Portugal, bastante longe do meu Alentejo. Praticamente só vinha à terra com intervalos de meses. Nos fins de semana, quando tinha tempo, aproveitava para turistar. O Norte tem imenso para visitar.
No Carnaval, aproveitei para ir ver as “Amendoeiras floridas”, que formavam e certamente ainda formarão uma paisagem de incontornável beleza natural. Fazendo a viagem de comboio do Porto até à Barca D’Alva. Nessa data ainda havia comboio até esta estação e até seguiria para Espanha. Portugal ainda não fazia parte da CEE, nem a Espanha. Ambos os países haviam saído, há escassos anos, das ditaduras. Ainda não havia a liberdade de circulação hoje existente. (... Hoje?!)
Fiz a viagem de ida e aguardei por outro comboio para regressar ao Porto. Tive algum tempo de espera, não sei precisar quanto, mas foi suficiente para obter alguns ramos de uma amoreira que havia na estação. Terei pedido certamente a algum funcionário da CP. Naquele tempo, nas estações de comboio havia sempre moradores, funcionários, chefe de estação, guarda da passagem de nível, outros trabalhadores. Eram quase todas ajardinadas, arborizadas e relativamente bonitas.
De regresso, aos ramos obtidos, embrulhei-os em jornais embebidos em água, para os manter humedecidos. Ainda voltei ao Alentejo e então abacelei os ramos, dos quais um vingou. Esse é o clone de Amoreira que havia ou ainda haverá na Estação da Barca D’Alva. Término, à data, da lindíssima Linha do Douro.
Falam em reabrir os troços que fecharam na década de oitenta. Um crime?! Falta de visão e estratégia?! Aconteceu por todo o País.
Mas ali, no Douro!...
Mais tarde, já neste século, sobrevieram os reconhecimentos internacionais: Douro Vinhateiro - Gravuras de Foz Côa.
Por aqui me fico, que ainda faremos a visita de comboio.