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Aquém Tejo

Há quem do Tejo só veja o além porque é distância. Mas quem de Além Tejo almeja um sabor, uma fragrância, estando aquém ou além verseja, do Alentejo a substância.

Há quem do Tejo só veja o além porque é distância. Mas quem de Além Tejo almeja um sabor, uma fragrância, estando aquém ou além verseja, do Alentejo a substância.

«O Chamiço, antiga freguesia do Priorado do Crato» (I)

 (Cap. I)

pelo Prof. Manuel Subtil

in. “A Mensagem”. p.5

«Em muitos mapas corográficos de Portugal, figura, ainda hoje, como freguesia do Crato, a velha povoação do Chamiço, situada a meio de uma linha recta cujos extremos são Vale do Pêso e Monte da Pedra.

E contudo o Chamiço desapareceu há muito tempo como povoação, e há mais tempo ainda como freguesia.

Quem, indo da Torre das Vargens, viajar pela linha de Cáceres, que atravessa o distrito de Portalegre, poderá ver, à esquerda, entre as estações da Cunheira e de Vale do Pêso, quando já se avista o perfil airoso da Serra de S. Mamede, uma espessa mancha de arvoredo, constituído por azinheiras, principalmente o cercado de velhas paredes. São as Tapadas do Chamiço.

Em tempos passados, essas tapadas denunciariam, logo de longe, a existência ali de uma povoação; porque no antigo Priorado do Crato, onde predominava o regime compáscuo, só eram permitidas tapadas nas proximidades dos povoados, para uso exclusivo dos seus habitantes. Tudo o mais era aberto e livre.

Situado num vale sem horizonte, em sítio pedregoso e triste, onde os terrenos são de fraca produção, o Chamiço foi sempre povoação pequena.

Assim, quando, em 1527, o rei D. João III ordenou que os Corregedores das seis Comarcas do reino mandassem proceder ao arrolamento de todos os moradores, achou-se que o Chamiço tinha trynta e seys moradores (a). Em 1708, segundo a Corografia Portuguesa do Pe. António Carvalho da Costa, tinha só 22 fogos.

Era, porém, freguesia mais antiga do que Monte da Pedra, que não existia ainda em 1527, e até mais antiga do que Flôr da Rosa, que só foi elevada a sede de freguesia em 21 de Setembro de 1749, por Decreto do Grão Prior Infante D. Pedro, irmão do rei D. José.

A igreja era pequena e só tinha três altares, no século XVI, com duas portas: uma na modesta fachada, outra lateral. Anexa à igreja havia uma pequena sacristia, em comunicação directa com o altar-mor.

Era orago da freguesia o mártir S. Sebastião, cuja imagem – que ainda existe, já retirada do culto, na igreja paroquial de Vale do Pêso – era muito venerada, como advogada contra as epidemias, tão frequentes naqueles tempos.

Não havia baptistério: a pia baptismal estava a um canto do corpo da igreja, à esquerda da porta principal, e esta era voltada para poente, como as da maioria dos templos católicos.

No vértice da empena da frontaria estava colocada a única sineta existente, sob uma pequena cúpula apoiada em quatro colunelos.

Os moradores do Chamiço eram, na sua maioria, pobres trabalhadores que, ou serviam como criados ou viviam de apascentar gado – lanígero principalmente – próprio ou alheio.

Como acabou a freguesia do Chamiço? Porque desapareceu uma povoação que, apesar de pobre e pequena, se manteve durante alguns séculos independente?»

(…)

*******

(a)– Mestrados e priorado do Crato em Alentejo – Arquivo Nac. Da T. do T. Gav.5, M.I, nº 47.

*******

(Notas: Segui o mais fielmente o original do Jornal. A divisão em capítulos pretende estruturar a leitura nos postais. Não tenho fotos de minha autoria do Chamiço.

Remeto para outros postais em Aquém Tejo e Apeadeiro da Mata. S.F.F.

E, também.)

Percurso Histórico: Flor da Rosa - Aldeia da Mata (II)

Início: Mosteiro de Flor da Rosa – Término: Anta do Tapadão

Túnel arbóreo Percurso Pedestre. Foto Original. 2022.05.18.jpg

No dia dezoito de Maio, na caminhada até à Horta do Carrasqueiro, utilizámos parte do mencionado Percurso Pedestre Histórico. Concretamente, a parte final, desde a Fonte da Bica até às Alminhas, temas que já abordámos nos blogues.

Neste excerto do percurso há uma verdadeira imersão com o espaço natural. A Natureza no seu esplendor! As hortas, espelho do trabalho humano. A Fonte, as respetivas funcionalidades e apetrechos de abastecimento.  A vegetação autóctone, a passarada em permanente chilreio, os gados. Elementos arquitetónicos remanescentes de antigos processos agrícolas: uma eira, um redondel. As vistas da Aldeia, lado Leste, sempre com os dois itens iconográficos: a torre sineira da Igreja Matriz e a araucária. Trabalhos nos lajedos de pedra granítica, para facilitar a caminhada, de quando este percurso seria uma das entradas na Aldeia, há séculos.

Mas voltando aos tempos presentes e sendo este trajeto parte de um “Percurso Pedestre” homologado oficialmente, ele necessita de ser mais bem tratado, preservado, conservado.

Isto é, precisa de ser limpo. E, à data, não estava.

Bem sei que quase ninguém liga a estas coisas. De caminhar, de andar a pé, de fazer percursos ancestrais, ademais fora dos circuitos da moda.

O pessoal gosta é de andar nas estradas, mesmo sem passeios, arriscando a própria vida, em vez de passear, caminhar por trilhos percorridos pelos nossos ascendentes, há séculos, há milénios. Carregados de História e de histórias. Que eles os calcorrearam a trabalhar!

(Que muito boa e santa gente nem isso faz. As passeatas são apenas nas esplanadas!)

Mas adiante…

 

Mas… se os caminhos estiverem, pelo menos devidamente limpos e minimamente transitáveis, tornam-se mais apetecíveis.

E é imprescindível que as entidades competentes os promovam e divulguem!

 

A foto, titulando o postal, ilustra parte do Percurso não devidamente arranjado, mas mesmo assim apelativo, formando um túnel arbóreo, de plantas autóctones.

 

“Rota Histórica de Flor da Rosa” (I)

Percurso Pedestre de Flor da Rosa  a Aldeia da Mata, passando pelo Crato.

Evocação de “Alminhas” em tempos de guerra!

Alminhas Novas Aldeia da Mata. Foto Original. 2022.02.02.jpg

Tenho consciência que os dias não estão muito para passeios. A chuva finalmente chegou. Tímida, é certo, mas desde o dia sete tem caído alguma água. Na Grande Lisboa, que lá para os Alentejo(s) nem por isso. Bendita água pluviosa! Tanta falta faz!

De qualquer modo, haverá tempo para voltar às caminhadas. No ano passado, tivemos oportunidade de realizar várias. Este ano, não tantas!

Todavia, aproveito para alertar para alguns aspetos sobre o percurso pedestre citado. Iniciando-se em Flor da Rosa, junto ao Mosteiro, segue na direção do Crato, posteriormente para Aldeia da Mata, terminando na Anta do Tapadão. Em Aldeia, que é a parte que conheço, integra, devidamente assinaladas, as Fontes do Boneco, da Ordem e da Bica, desde 2021, quando este trajeto foi estruturado no terreno.

Já me congratulei com esse facto, que corresponde, parcialmente, ao que venho defendendo. Isto é, organização de um Percurso Pedestre pelos arredores da Aldeia, incluindo as várias Fontes já divulgadas nos blogues e as Pontes da Ribeira do Salto e da Ribeira das Pedras.

As Passadeiras: da Ribeira das Pedras, do Porcozunho e da Lavandeira. No acesso a esta Ribeira, a respetiva calçada.

Percurso que tenho designado: Por Fontes, Passadeiras e Pontes.

Voltando ao Percurso Histórico referido, atentando no que constatei e respetivos monumentos locais assinalados, verifiquei que as Alminhas de Aldeia da Mata, tanto as Alminhas Novas como as Alminhas Velhas não estão referenciadas.

Um contrassenso! Porque estes monumentos, singelos é certo, estão associados, por tradição oral, a um combate, trágico como todos os combates, ocorrido precisamente à entrada de Aldeia da Mata, em 1801, na designada “Guerra das Laranjas”. E que se iniciou, pasme-se(!) precisamente em Flor da Rosa, junto ao Mosteiro.

A ocorrência desse combate, historicamente designado “O Combate de Flor da Rosa”, está documentada. Consultei documentos sobre o facto, no Arquivo Histórico Militar, em Lisboa e tenho cópia em CD da respetiva descrição.

Para saber um pouco mais sobre o assunto, consulte, SFF, para melhor esclarecimento!

De modo que o que pretendo é lançar um apelo aos Organizadores destes percursos.

SR.s Organizadores, façam favor de assinalar devidamente as “Alminhas de Aldeia da Mata”, como parte integrante e estruturante desse Percurso Histórico!

Como?! Saberão melhor que eu.

Uma sinalefa condizente com a respetiva situação no percurso?!

Hei-de comunicar, nomeadamente a CIMAA.

Grato pela atenção.

*******

E a propósito de “Alminhas” e de guerras…

Que a guerra da Ucrânia termine!

Que o regime russo retire as tropas invasoras!

Ucrânia reconhecida, sob todos os aspetos, como Nação e Estado Independente.

Que haja Paz!

 

Barragem do Pisão: Talvez Sim ou Talvez Não?!

Novas Promessas ou Concretizações?!

Li esta notícia recente. “Barragem do Pisão vai mesmo avançar.

O Senhor Primeiro-Ministro, Drº António Costa, foi a Portalegre… (Cidade do Alto Alentejo…) e a Flor da Rosa, para anunciar que as Obras da Barragem do Pisão vão mesmo arrancar. Repetiu a dose de visitas alentejanas! É caso para dizer que “não há fome que não dê em fartura!”

Sobre a dita Barragem do Pisão, eu sou mesmo como São Tomé. É ver pra crer!

Desde criança que me lembro de ouvir falar de uma barragem a construir perto da aldeia do Pisão, localidade que iria ficar debaixo de água. Na altura não conheceria a palavra submersa. Nem sabia onde ficava o dito Pisão. O meu Mundo era muito pequeno, embora eu avistasse a Serra ao longe.

(“Ao longe, a Serra / Uma miragem / Duma impossível viagem.” - Esta estrofe será já da adolescência.) Adiante…

Quanto à dita construção da aludida Barragem, prometida e reprometida, como a “Sempre Noiva”, algumas questões se me tecem.

Neste ano de eleições, é um afã de realizações futuras, a prometer. E é por todo o lado. 

É um apostar forte nas câmaras que se querem manter ou recuperar. “Ganhar” é o termo que se usa, mas de que não gosto. O espírito dos Autarcas deverá / deveria ser: “Servir”.

O PSD também “aposta” forte. Já nas anteriores eleições, os partidos investiram fortemente nas respetivas candidaturas na Cidade. Todavia a candidatura de Independentes – CLIP, conseguiu manter a liderança da Câmara. Conseguirá também desta vez?

Barragem Maranhão. Foto Original. 2019.10.03.jpg

Ainda sobre a Barragem e respetivos usos múltiplos.

Não esquecer!

Vai situar-se na Ribeira de Seda, que é uma das principais fontes de abastecimento da Barragem do Maranhão. A montante desta. Logo parte do caudal da Ribeira ficará retido nesta Barragem do Pisão.

Barragem do Maranhão. Foto original. 2019.10.03.jpg

A do Maranhão, cujas fotos ilustram o postal, já tem falta de “liquidez”. Porque chove pouco. A foto é de Outubro de 2019, no culminar de uma seca de vários anos. Mas também porque há um uso superintenso nas regas dos olivais que a rodeiam.

Esta Barragem acolherá as águas pluviais da bacia hidrográfica da Cidade e Zona Industrial e Comercial e arredores. Bem como das respetivas estações de tratamento dos esgotos. Ou será que estarei enganado?

Água de qualidade para abastecimento das populações?!

(Eu vou ali… já venho.)

E se, no espaço territorial de acesso de águas, forem plantar novamente olivais como os que vemos no Maranhão, que precisarão intensamente de água para regar… então será melhor deixarem-se estar, deixarem a água correr no seu percurso natural, a ver se enche o Maranhão.

A ideia da central fotovoltaica, julgo interessante.

É uma barragem que vai dar para muita coisa, já se vê!

E terei dito tudo o que será importante e importa dizer sobre a Barragem?!

Ah! O Turismo também!

E… as Barragens para Abastecimento das Populações deveriam ser um Santuário!

 

E, por promessas:

Não se esqueçam do IP2 e dos vários estrangulamentos que tem no Norte Alentejano e que são urgentes de resolver.

  • Atravessamento dos Fortios,
  • Cruzamento de Alagoa / Flor da Rosa,
  • Entrada em Portalegre,
  • Variante de Estremoz, a das célebres rotundas.

São troços mais do que necessários.

Sem rotundas!

Com Muita Saúde!

P. S. - Fotos e Texto Originais. Não esqueça!

 

CURIOSIDADES sobre as Paróquias

Algumas CURIOSIDADES sobre as Paróquias

 

Nestas “Memórias”, para além do que já foi referido, há ainda mais alguns aspetos que gostaria de realçar. Ficando ainda muita informação, mas que convido a quem tiver interesse que pesquise nos “sites” já referidos e que assinalo no final, especialmente no da Universidade de Évora.

 

Todas as povoações tinham Pároco e algumas coadjutor(es) e outras pessoas adstritas ao trabalho religioso da Paróquia.

Todos eram remunerados, recebendo “ordenado / côngrua / renda”, na forma de géneros e dinheiro.

O nível de respostas é muito variado. Alguns párocos são bastante prolixos, desenvolvendo e pormenorizando nas respostas, incluindo até assuntos sobre outras paróquias, enquanto outros são bastante sintéticos.

Todos referem o orago, bem como os altares e santos das respetivas igrejas e ermidas existentes.

Todas as paróquias pertenciam ao “Priorado do Crato”.

Não tinham correio próprio, serviam-se do do Crato. Gáfete servia-se do de Portalegre.

Entre outros aspetos, referem-se também à situação das povoações, a distância às principais localidades e a Lisboa, em léguas.

 

Entre as paróquias ainda figurava a de “Monte Chamisso”, que ainda era habitada nesta data. (Despovoar-se-ia cerca de um século depois.)

Também existia a “freguezia de Nossa Senhora dos Martires” como paróquia independente e que englobava três lugares: “Monte de Ordem, Monte da Velha, e Monte Pizam”.

100px-CRT-montepedra.png in wikipédia

O pároco de Monte da Pedra desenvolveu bastante sobre a sua localidade, explicando, entre vários outros aspetos, a origem do respetivo nome (topónimo), que se deve à notabilidade de duas pedras que estão no limite da terra: o “ Penedo Gordo” e a “Lagem de Santo Estevão”.

O pároco do Crato menciona que Monte da Pedra era povoação no Lugar do Sourinho, tendo os moradores mudado para o local atual, mas que em 1634 ainda a Igreja estava nesse Lugar.

Flor_Rosa_brasao_.gif - in wikipédia.

 A aldeia de Nossa Senhora de Flor da Roza tinha três feiras francas de direitos reais, que duravam um dia: na primeira 6ª feira de Março, a 15 de Agosto e a 8 de Setembro. Estas eram as três feiras existentes no espaço do atual concelho.

Fora recentemente elevada à categoria de Paróquia, em 21 de Setembro de 1749.

Fazia-se muita e singular louça de barro. Havia também um pinhal grandioso.

vale do peso.jpg. - in wikipédia.

Sobre a “Aldea do Val do Pezo” também são disponibilizadas pormenorizadas informações.

Refere-se a origem do nome da povoação. A antigamente cidade do Pezo, tomou o seu nome de uma formosa e bem parecida pedra, existente perto da aldeia, junto da qual se supunha existirem tesouros da antiga cidade.

Também a leste da aldeia existia uma pequena povoação, chamada Pedo Rodo, à data já em ruínas, mas de que existiam ainda nos livros da igreja, assentos de casamentos e batizados datados de cem anos antes, século XVII.

Em Fevereiro, havia duas romarias: a dois, a da Senhora da Luz e a doze, a de Santa Eulália.

100px-CRT-gafete.png - in wikipédia. -

A villa nova de São João de Gáfete, embora integrada no Priorado do Crato, tinha termo próprio, não pertencendo, à data, ao do Crato. Tinha Hospital e Casa de Misericórdia.

crato.gif

Na Villa do Crato houve um grande incêndio, a 29 de Junho de 1662, em que arderam todos os cartórios e papéis oficiais. Este incêndio ocorreu na sequência do ataque dos espanhóis, capitaneados por D. João de Áustria, na frente de um exército de 5000 infantes e 6000 cavaleiros. Este ataque integra-se na designada “Guerra da Restauração” (1640 - 1668), após Portugal ter recuperado a “Independência” em 1 de Dezembro de 1640.

Neste ataque a que a guarnição da praça resistiu durante cinco horas, apesar de em piores condições que o atacante, acabando a vila por ser invadida e sujeita à vontade do vencedor. Pelas cinco horas da tarde, entraram os vencedores e puseram fogo em muitas casas de cada rua, destruindo 282 moradas de casas na vila e 30 no castelo. Destruíram a torre, edifícios, fortificações, a igreja de S. João, arrasando completamente o castelo.

 

Estes são alguns aspetos que podem ser realçados da análise sobre o tema abordado “As Memórias Paroquiais de 1758”.

Muito ainda fica por abordar.

Formulo um convite à pesquisa sobre esta temática.

E, quem consultar o blog, a leitura de "posts" anteriores que enquadram todo o tema.

 

Notas Finais:

 Neste trabalho para o “post” resolvi documentá-lo com os “brasões de armas” das freguesias recentes, antes da última alteração de 2013, porque sendo embora brasões atuais, na imagiologia apresentada e simbologia imanente “vão beber informação às fontes” do passado.

 Uma versão deste trabalho global sobre as "Memórias Paroquiais de 1758" foi publicada no Jornal “A Mensagem”, em 2014.

Com este "post", concluo, em princípio, o trabalho sobre este tema e que me propusera divulgar na net.

 

Webgrafia

Algumas das Fontes pesquisadas:

Na elaboração deste trabalho também foram feitas pesquisas em documentação bibliográfica. Alguns livros também estão disponíveis online, nomeadamente:

- “Memórias Paroquiais de Campanhã”, versão online.

- Sinopse das “Memórias Paroquiais do Alandroal”, de Isabel Alves Moreira.

- (…)

 

Outra Bibliografia:

CARDOSO, P. LUIZ; DICCIONARIO GEOGRAFICO … ; Regia Officina SYLVIANA e da Academia Real, Lisboa, 1747.

 FLORES, Alexandre M.; Vila e Termo de Almada nas Memórias Paroquiais de 1758, Separata da Revista Anais de Almada, Nº 5 – 6; Almada, 2009; Edição de Autor.

 

(Imagens de brasões das freguesias, in wikipédia.)

 

 

 

 

Aspetos Genéricos e Comparativos das várias Paróquias

 

Dados Demográficos

1758

Breve Introdução

 - Há que ter em conta que as contagens eram feitas numa perspetiva diferente da que usamos atualmente, nomeadamente religiosa, em função da obrigação das pessoas face ao cumprimento dos vários sacramentos.

 - Não há também uma uniformização nas designações dos conceitos em análise, nem nas quantidades apresentadas.

 - Apresentam-se os valores em numeração árabe, para uma melhor compreensão.

 

 *******

 

“Aldea da Mata”: 300  "pessoas de sacramento" e 80 “menores”.

 

“Aldea do Val do Pezo”: 120 vizinhos, num total de 380 pessoas.

 

“Monte Chamisso”: 25 vizinhos, num total de 81 pessoas.

 

“Monte da Pedra”: 68 vizinhos, num total de 255 pessoas.

A freguesia toda tinha 91 vizinhos, num total de 323 pessoas.

À paróquia/freguesia de Monte da Pedra pertenciam, à data, mais três aldeias, a saber:

Monte do Sume” - 17 vizinhos, 44 pessoas;

“Cazal de Folgão Palha” – 2 vizinhos, 10 pessoas;

 “Monte de Franquino” – 4 vizinhos, 15 pessoas.

 

“Nossa Senhora de Flor da Roza”: 140 fogos, 400 “pessoas de confissão e comunhão", 40 “ só de confissão" e 100 “inocentes, não obrigados aos preceitos".

 

“ Nossa Senhora dos Martires”: 90 vizinhos, num total de 350 pessoas.

 

“Villa do Crato”: 414 vizinhos, que englobavam 1128 pessoas.

 

(“villa nova de São João de Gafete”: 205 vizinhos, num total de 512 “pessoas maiores” e 94 “menores”.

À data, Gáfete não pertencia ao “termo” da vila do Crato, embora anteriormente tivesse pertencido.)

 

À data e de acordo com as informações do “Pároco da villa do Crato”, o termo para além da própria vila, compreendia as seguintes aldeias, com os respetivos dados demográficos, nem sempre exatamente coincidentes com os explicitados pelos respetivos párocos de cada Paróquia:

“Aldea da Matta”, com 124 vizinhos, 386 pessoas;

“Monte da Pedra”, com 91 vizinhos, 318 pessoas;

“Chamisso”, com 25 vizinhos, 81 pessoas;

“Val do Pezo”, 101 vizinhos, 380 pessoas;

Senhora dos Martires”, 90 fogos, 350 pessoas;

“nossa Senhora de Flor da Roza”, 135 fogos, 550 pessoas.

 

*******

 

 Dados populacionais das Freguesias, 2011, segundo informação recolhida in wikipédia, comparativamente com a População das Paróquias estimada em 1758.

Freguesias

População

2011

População das Paróquias estimada em 1758

Aldeia da Mata

374

380**/386*

Crato e Mártires

1674

----

Crato = 1128*

“Senhora dos Martires”

Mártires = 350**/350*

Flor da Rosa

263

540**/550*

Gáfete

856

606**

Monte da Pedra

280

323**/318*

Vale do Peso

261

380**/380*

“Chamisso

------

81**/81*

TOTAL

3708

3788**/3799*

 

* - segundo informação prestada por “Pároco da villa do Crato” .

** - segundo informação prestada pelo Pároco da respetiva Paróquia.

 

- Nem sempre se verifica concordância, mas não nos podemos esquecer das condições da época, meados do século XVIII e das “dificuldades de comunicação” a todos os níveis.

De qualquer modo, temos que reconhecer que foi um trabalho notável, à data, dado que apesar de todas as dificuldades ele foi realizado à escala nacional! Paróquia a paróquia!

 

- Note-se que, atualmente, das Povoações existentes, apenas Gáfete e Crato e Mártires têm mais população que em 1758!

E, na totalidade, o concelho tem ligeiramente menos população que na data referida – 1758.

Menos 80 a 90 pessoas.

 

 Nota Final:

Esta pesquisa foi realizada a partir dos dados facultados pela Universidade de Évora no site específico sobre as "Memórias Paroquiais".

Memórias Paroquiais de 1758

portugal1758.di.uevora.pt/
 
 

 

 

 

 

 

 

 

QUESTÕES suscitadas pela análise das respostas ao inquérito sobre a Paróquia de Aldeia da Mata

 

QUESTÕES suscitadas pela análise das respostas ao inquérito sobre a Paróquia de Aldeia da Mata

 

A leitura destes textos suscita-nos muitas questões. Aparentemente tão simples são de extraordinária riqueza informativa e formativa. Muitas diferenças com a realidade atual, mas persiste um fio condutor que nos liga ainda a esse passado…

 

Um dos aspetos que se mantem bastante comum com a atualidade é a Igreja Matriz. Mas mesmo aí há diferenças. À data referida, o designado altar de São João ainda não existia. Aí haveria uma porta lateral…O altar terá sido implantado mais tarde…

 

Mais algumas situações que me surpreendem, a saber: a informação disponibilizada, comparativamente com a que nos é facultada por outros Párocos do “termo da vila do Crato” revela-se limitada, parece haver lacunas na informação prestada.

 

Por ex. pouco se informa sobre a Ribeira, enquanto outros párocos sobre ela falam: a Ribeira de “Cojancas”.Também referida como daVargem”.

(Apenas se refere o que foi transcrito no “post” anterior, no respeitante ao rio.)

É de supor que os moinhos referidos sejam o das Caldeiras e o do Salgueirinho. 

 

Contrariamente ao que é explicitamente pedido sobre pontes, não é referida a ponte da Ribeira do Salto.

 

Em contrapartida, o Pároco de “Flor da Roza” descreve bastante sobre a “ribeirinha chamada Margulhão” que nasce junto a Alagoa e se junta com a “ribeirinha chamada do Val do Pezo” na ponte de “cojancas” e que daí para baixo se mantem com esse nome. Que vai morrer na ribeira de Seda, por baixo do sítio do monte Redondo. E que tinha duas pontes, uma, de pau, a caminho do “Chamisso” e outra de pedra, no sítio de “Cojanquas”. “… que tem quatro léguas desde o nascimento até o sitio aonde entra na ribeira de Seda, e tão somente passa junto a esta povoação, e á de Aldea da Matta, distante desta uma légua.”

Referências do pároco de “Val do Pezo”, sobre as supracitadas ribeiras:

“juntam-se estas duas ribeiras meia légua distante desta aldeia, na
estrada, que vem da Vila do Crato para a de Abrantes, aonde já chamam a ribeira de Cujancas, e aí tem uma bem feita ponte de pedra, a que chamam  a ponte de Cujancas; e em pouca distancia perde o nome, porque chegando ao limite de Aldeia da Mata já tem o nome de ribeira da Vargem.”

 

Ainda no respeitante a Aldeia da Mata, não se fala nada sobre a “Anta”, que é visivelmente «qualquer coisa notável».

Nem há qualquer referência à “Lage do Ouro”. Será que a tradição oral não consagraria nada sobre este assunto?! À data, não haveriam evidências visíveis da ocupação romana?

Questões de religiosidade que condicionariam a menção destes temas, dada a sua conotação não cristã, associada ao paganismo e/ou islamismo?!

 

Também surpreende não haver qualquer referência à construção ou reconstrução da Igreja, dado ser o inquérito de 1758 e a Igreja ter na sua frontaria a data de 1757. Seria plausível haver no inquérito alguma menção ao assunto.

 

Igualmente ao referir as ermidas não são mencionados os dois cruzeiros aí existentes que são datados do século XVII (1672 e 1673).

 

Considerando a população referida (380 pessoas), a povoação teria pouco mais de 100 fogos, o que de algum modo se confirma pelas informações prestadas pelo pároco do Crato “… Aldea da Matta que tem cento e vinte e quatro vizinhos, e trezentas, e oitenta, e seis pessoas …” Relacionando com a referência à localização das ermidas e com os dados dos fogos/habitações existentes pode-se inferir que, na época, o espaço físico da “Aldea” ocuparia sensivelmente as atuais ruas Larga, S. Pedro, Travessinha, Ladeira, Largo do Terreiro, Rua de S. Martinho e iria até ao vulgarmente designado “Alto do Castelo” e “Baixa”. Talvez um pouco mais adiante na direção da Ermida de Stº António, que juntamente com a de São Pedro definiriam os limites do “espaço sacralizado” da povoação. (Este espaço físico conta com cerca de 120/130 habitações, que nas décadas de sessenta/setenta do séc. XX, muitas manteriam ainda a estrutura dessa época. Hoje ainda restam algumas dessas habitações nalgumas destas ruas, apesar das muitas modificações que houve nas casas, a estrutura das ruas mantém-se.)

Rua do Norte  - Fundão 1.jpg. Foto de F.M.C.L. 1984/85?

É ainda o pároco da vila do Crato que menciona a existência de nove ermidas na sua paróquia, entre as quais destaca a de “Sam Miguel”.

“… com distancia de meia légua para a parte do poente está a Ermida de Sam Miguel: no altar maior se venera o Santo Archanjo e uma Imagem da Senhora com o titulo dos Remédios, estão anexas a esta Igreja algumas fazendas, e tem o Administrador de mandar dizer nesta Igreja missa aos Domingos e dias santos …”  (…)

“Na Ermida de Sam Miguel é procurada com muita frequência a Imagem da Senhora dos Remédios, não só das pessoas da vila e aldeias, mas de partes distantes com mais especialidade nos sábados da quaresma costuma a maior parte dos votos ir descalços ou todo o caminho, ou parte dele segundo suas capacidades, sendo o caminho áspero por ser de areias grossas; dia de Sam Miguel é o maior concurso das terras vizinhas.” (…)

 

De paróquias de outros concelhos também há referências a “Aldea da Matta”. Os párocos das “villas” de “Chancellaria” e de Seda, de nome antigo “Arminho”, também se referem a Aldeia, mencionando o seu avistamento das respetivas localidades e a distância a que se situam.

 

O pároco da “villa” de Seda também descreve bastante sobre a Ribeira de Seda, que, segundo refere, citando o “Doutor Antonio Gonsalves de Novaes”, se chamara “Arminho”, por ter o seu princípio na Serra da Aramenha, perto de Portalegre. Outros párocos igualmente falam desta Ribeira, desde o do Crato até ao de Avis.

Diz ainda o mencionado pároco sobre a citada Ribeira: “… por cima desta Villa em distância de meia légua entra nela outra chamada Cujancas pela parte do Norte, e logo mais abaixo outra da mesma parte mais pequena que se chama Alfeijolos; …”

 

Na questão sobre os “frutos da terra” apenas se menciona centeio, algum trigo e milho.

Não há referência nem ao azeite nem a gados, por ex.!

De facto, também não há qualquer menção a lagares de azeite… Muitas dúvidas e interrogações subsistem!…

Contudo, dada a ancestralidade de muitas oliveiras existentes, vários olivais centenários e algumas oliveiras que seguramente rondarão a escala milenar, não haveria produção de azeite na paróquia, nessa época?!

E vinho?!

Também não se menciona nada relacionado com os montados…

Sendo apenas a produção agrícola constituída pelos cereais mencionados, seria um povoado relativamente pobre.

Há certamente lacunas informativas.

Foto1581.jpg. Foto de D.AP.L. 2014

Foto1394.jpg. Foto de D.A.P.L. 2014Foto1405.jpg. Foto de D.A.P.L. 2014

Curiosamente, no “Dicionário Geográfico” de 1747, documento anterior ao que estamos a analisar, aprofundam mais esta questão, referindo como “frutos da terra”, para além dos citados, também vinho, gado miúdo e grosso, lã e, pasme-se: seda. Neste documento também referem a existência de uma “fonte dos Gaviões”. E que não falta caça miúda e também lobos e raposas.

 

 

Nota: uma versão deste texto foi publicada no Jornal "A Mensagem", em 2014.

 

 

O Topónimo “Aldeia da Mata”

Foto1395.jpg

 

O Topónimo “Aldeia da Mata” define a localidade na sua essência, aldeia: pequena localidade, geralmente com poucos habitantes, núcleo populacional feito de casas contíguas, tipo alentejano. “Nos começos da Nacionalidade designava não uma povoação mas um casal ou herdade existente num sítio ermo.”(1)

Quanto ao primeiro termo do topónimo, Aldeia, entende-se facilmente o seu significado.

 

No referente aos outros, da Mata, já se nos levantam interrogações, dado que na atualidade não existe nenhuma mata significativa, justificativa do topónimo.

Mas se o nome consagra esses termos é porque terá existido alguma mata importante, para que a povoação tenha incorporado essa nomenclatura. Que mata terá sido essa, suficientemente importante para daí derivar o nome de Aldeia da Mata?!

 

Nas Memórias Paroquiais consultadas, séc. XVIII, já não há qualquer referência a essa Mata.

Mas, segundo diversos autores, essa mata existiu e dela deriva o topónimo.

Alarcão, J., in Revista Portuguesa de Arqueologia, volume 15, 2012, menciona esse facto, a partir do documento de doação da herdade que D. Sancho II, em 1232, fez à Ordem dos Hospitalários, mais tarde designada por Ordem Militar de Malta, consultado a partir da respetiva publicação em 1800, por José Anastácio Figueiredo.

O documento refere que um dos limites dessa Herdade é a mata de Alfeijolas.

 

Curioso que o nome Alfeijolas persiste na região, no termo Alfeijós, designando a Ribeira de Alfeijós, com vários nomes, conforme os locais por onde corre.

 Inicialmente designa-se Ribeira do Fraguil e tem origem em ribeiros que nascem a norte do Monte da Taipa. Corre a leste da Cunheira, dirige-se para sul, passa nos Pegos, adquirindo o respetivo nome: Ribeira dos Pegos.

Correndo na direção norte-sul atravessa a Linha do caminho-de-ferro do Leste, e a sul desta Linha, adquire o nome de Ribeira de Alfeijós. Corre a oeste dos “Cabeços do Barreiro”, Altos Barreiros, cuja cota mais elevada, 194 metros de altitude, se situa no monte de ALFEIJÓS.

A jusante situam-se dois Montes de habitação, também designados de Alfeijós: a leste da Ribeira, o Monte de Alfeijós de Cima e a oeste, o Monte de Alfeijós de Baixo.

A mencionada Ribeira de Alfeijós desagua na Ribeira de Seda, a jusante da foz da Ribeira de Cujancas e a montante da ponte romana de Vila Formosa.

 

É pois interessante que ainda atualmente o nome de Alfeijós, corruptela de Alfeijólas, persista na região, embora não existam sinais da referida mata.

As Memórias Paroquiais de 1758 também referem a Ribeira de Alfeijolos, assim designada pelo pároco da “villa” de Seda, embora já não referenciem a mata.

 

Qual o espaço territorial ocupado por essa mata que em 1232 seria significativa e foi inclusive, nessa época, motivo de disputas pela sua posse?!

 

As matas eram uma fonte de sustento, de recursos energéticos, de matérias-primas, sendo muito relevantes para povos e localidades. Mas estiveram sempre sujeitas a delapidação constante: corte, desbaste, fogos, arroteamento para agricultura.

Seria certamente uma mata de árvores e arbustos próprios destas condições climáticas: azinheira, sobreiro, carvalho negral, carrasco, zambujeiro. Medronheiro, aroeira, sanguinho e, entre as plantas mais arbustivas, a giesta, a esteva, o trovisco, a silva, a madressilva, etc. Ao longo das linhas de água, a mata ribeirinha: freixos, salgueiros, choupos, sabugueiros...

 

E geograficamente, ocuparia apenas a região atualmente a sul da Linha do Leste, onde persiste o respetivo nome? Prolongar-se-ia para norte, pela bacia hidrográfica da Ribeira de Alfeijós/Pegos/Fraguil até à Ola e Taipa? Ocuparia o território entre esta Ribeira e a Ribeira de Cujancas, inclusive ultrapassando-a e aproximando-se do espaço da atual freguesia de Aldeia? Teria uma área ainda mais vasta, conforme alguma documentação faz supor?!

 

Segundo o documento de 1232, esta “Matam de Alfeigolas” fazia parte dos limites da referida herdade. Curioso que o limite sul/sudoeste do atual concelho de Crato também se situe precisamente a sul/sudoeste de Aldeia da Mata. Outros limites do atual concelho do Crato também coincidem ou se aproximam de limites dessa herdade, referidos no citado documento de doação por D. Sancho II, à Ordem dos Hospitalários ou de São João de Jerusalém, designada por Ordem Militar de Malta, a partir de 1530.

 

A oeste, o Sume; a norte/noroeste e nordeste, o Rio Sor em parte significativa do seu percurso; a leste, Almojanda e parte do troço da Ribeira de Seda, sendo que esta Ribeira também delimita a sul. Ainda a sul, o limite segue numa linha relativamente paralela entre as Ribeiras do Cornado e de Linhais, pelos Cabeços de S. Lourenço e de S. Martinho. Ainda nesta direção sul, Alter do Chão, também é referida no documento como um dos limites.

E, frise-se, a mencionada Mata de Alfeijolas como um dos limites da herdade.

 

mapa  concelho crato.gif

 

A mata existente no século XIII (1232), já não existente no século XVIII, até quando terá persistido enquanto tal?

Teria sido o nome da aldeia alguma vez Aldeia da Mata de Alfeijolas? Haverá documentos comprovativos? Ou terá sido sempre Aldeia da Mata, dada a importância da própria mata?!

 

 

Nota final:

 - Agradecimento ao Srº Carlos Eustáquio pela prestimosa colaboração na consulta das Cartas topográficas referentes aos concelhos do distrito de Portalegre.

 

Fontes de Consulta (algumas):

- ALARCÃO, Jorge; Notas de Arqueologia, Epigrafia e Toponímia; Revista Portuguesa de Arqueologia, volume 15; Direção Geral do Património Cultural, 2012.

- FIGUEIREDO, Jozé Anastasio; Nova História da Militar Ordem de Malta, e dos Senhores Grão-Priores della, em Portugal; Officina de Simão Thaddeo Ferreira, Lisboa, 1800.

- MACHADO, José Pedro; Dicionário Etimológico da Língua Portuguesa, Livros Horizonte, 7ª edição, 1995.

- SAA, Mário; As Grandes Vias da Lusitânia, o Itinerário de Antonino Pio, Tomo II, MCMLIX.

- (1) Lexicoteca, Moderna Enciclopédia Universal, Círculo de Leitores, Tomo I, 1ª edição, 1984.

- Cartas Topográficas do Instituto Geográfico do Exército.

- Wikipédia, enciclopédia livre.

 

Texto publicado no Jornal "A Mensagem", Nov. 2014

As “Alminhas” de Aldeia da Mata e “O Combate de Flor da Rosa"

Será que as lendas têm um fundo de verdade”?

A leste da freguesia de Aldeia da Mata, concelho de Crato, existem dois monumentos peculiares e singelos, mas muito significativos, conhecidos como “As Alminhas”. Um fica mais destacado à saída da povoação, à beira da estrada nacional, na direção da sede de concelho e pela sua localização é facilmente referenciável, sempre que se entre ou saia da localidade na direção mencionada. O outro, um pouco mais recatado, encontra-se relativamente próximo do primeiro na continuação da estrada, mas na direção de Alter do Chão, antes de se chegar ao Cemitério da Aldeia, precisamente na Rua das Alminhas.

 

Estes monumentos que são relativamente comuns por todo o Portugal, seja nas zonas rurais ou urbanas, nas aldeias ou nas cidades têm um significado muito especial que se tem vindo a perder, mas que muitos têm escrito na respetiva estrutura: “Rezai pelas Alminhas”… “Mais do que uma forma de arte, as Alminhas nasceram com uma função: salvar e rezar às almas do purgatório.”(1)

 

Aos monumentos da Mata estão associadas algumas estórias ou lendas e tradições que se perderam na azáfama dos tempos modernos.

Uma das estórias que se contavam referia-se à “Unha de Boi”.

Outra estória ou lenda dizia que os dois monumentos assinalavam o local onde decorrera uma batalha ou guerra e que delimitavam o espaço onde correra o sangue derramado pelos intervenientes nessa contenda. Esta estória foi passando de geração em geração, e era-nos contada em crianças, quando por ali passávamos ou íamos festejar os “Santinhos”, no dia um de Novembro. Não sei se ainda hoje será contada às crianças de agora, nesta Aldeia globalizada …

 

Ao ler o livro “Guerra das Laranjas 1801”, do Professor Doutor António Ventura, integrado na coleção “Guerras e Campanhas Militares da História de Portugal”, Editora QuidNovi, 2008, deparou-se-me um capítulo muito curioso designado pelo autor como “O Combate de Flor da Rosa”.

Muito sinteticamente, esta “Guerra” resultou da invasão de Portugal, pelas tropas espanholas comandadas pelo generalíssimo D. Manoel de Godoy, através do Alentejo e ocorreu durante Maio e Junho de 1801. Esta ofensiva já se integra na designada “Guerra Peninsular”(2), precede as denominadas “Invasões Francesas” de 1807, 1809 e 1810 e foi um desastre para Portugal. (Entre outros aspetos, Portugal perdeu a soberania sobre Olivença, que nunca mais seria incorporada no Estado Português.)

 

Em 20/05/1801, com várias Divisões, os espanhóis iniciaram as ações militares sobre as praças de Olivença, Juromenha, Elvas e Campo Maior.

As principais cidades e vilas fronteiriças acabaram por ser ocupadas ou neutralizadas pelo exército espanhol.

Olivença e Juromenha, praças-fortes, renderam-se sem oferecerem resistência.

Elvas foi cercada, o governador não aceitou a rendição, mas esta praça-forte, considerada “a chave do reino” ficou neutralizada até final da Guerra, não tendo havido propriamente ataques em força, mas cercando-a e com pequenas ações, os espanhóis controlaram a situação, impedindo as tropas de saírem da cidade.

 

No dia vinte e nove de Maio, o inimigo atacou fortemente Arronches, sendo “a derrota dos portugueses rápida e completa”(3), tendo as tropas portuguesas abandonado o campo de batalha.

As tropas portuguesas estacionadas entre esta vila e Alegrete foram-se dirigindo para Portalegre.

Campo Maior, cercada desde vinte de Maio, resistiu e combateu com denodo nas condições disponíveis, sofrendo o cerco até seis de Junho, quando em conselho de guerra foi decidido aceitar a rendição, em termos honrosos. A capitulação foi assinada no dia sete, mas os defensores saíram com todas as honras militares.

 

A vinte e nove de Maio, houve um conselho de guerra em Portalegre, presidido pelo Duque de Lafões, que era o comandante em chefe de todas as tropas portuguesas, com o posto de marechal general. Decidiu-se a retirada do exército lusitano na direção do Tejo. De passagem, em Alpalhão, em novo conselho de guerra, decidiram concentrar o exército em Gavião, tendo acampado junto desta localidade a trinta e um de Maio.

 

É neste contexto de retirada do exército que se enquadra o referido “Combate” que tendo-se iniciado em Flor da Rosa se haveria de concluir junto a Aldeia da Mata.

 

 Por ordem do Duque de Lafões e visando a recolha de abastecimentos, saíram as tropas, ao final da tarde de três de Junho, do campo do Gavião com destino a Flor da Rosa e Crato, com passagem por Tolosa e Gáfete. O comando foi entregue a D. José Carcome Lobo, que comandara as tropas portuguesas em Arronches. Constituía este corpo de tropas, 4 Companhias de Granadeiros, 2 de Caçadores, num total de 600 homens de Infantaria; 68 de Cavalaria, 40 portugueses e 28 ingleses e 4 peças de Artilharia. Eram seguidos por 70 carros, requisitados na região, alguns puxados por mulas, a maioria por bois, para o transporte das mercadorias. Segundo o comandante, chegaram a Flor da Rosa entre as dez e as onze horas do dia 4 de Junho, tendo percorrido parte do trajeto durante a noite, rompendo-lhes o dia perto de Tolosa.

No dia um de Junho, a partir de Arronches, os espanhóis marcharam em direção a Portalegre, passando por Alegrete, tomando-a sem resistência, o que aconteceu também com a cidade. No dia dois de Junho ocuparam Castelo de Vide e atacaram Marvão, que repeliu o invasor. Foram também destacadas forças para o Crato e Flor da Rosa, onde o exército português, na fuga precipitada que fora fazendo ao longo do norte do Alentejo, havia deixado provisões, indispensáveis a qualquer dos exércitos. Estas forças inimigas partiram de Portalegre, pela manhã do dia quatro de Junho, sendo seu comandante o Marechal de Campo, Marquês de Mora, comandando 2500 homens de Cavalaria e três batalhões de Infantaria.

 

A leitura deste trecho do livro motivou-me para consultar no Arquivo Histórico Militar, no Museu Militar, em Lisboa, o documento relatando o ocorrido neste combate.

 

Mas deixemos o próprio comandante das tropas portuguesas, coronel D. José Carcome Lobo, narrar os acontecimentos:

“… pela uma para as duas horas da tarde, deram parte as Vedetas e avançadas de vir o inimigo pelo lado de Portalegre, fiz imediatamente pegar em armas a toda a tropa… coloquei duas bocas de fogo em lugar próprio de bater o inimigo de frente logo que chegasse ao alcance… destaquei duas Companhias de Caçadores… para vir ganhando pelos lados os flancos do inimigo… ordenando também aos 40 Cavaleiros portugueses e 28 Dragões ingleses que sustentassem cada um destes partidos…

Adiantou-se o inimigo e principiou a Artilharia a jogar sobre ele… porém a Cavalaria tanto inglesa como portuguesa fugiu a toda a brida, atropelando não só a Infantaria, mas até a minha própria pessoa e então expostas, sem nenhum apoio, as Companhias de Caçadores fizeram quanto puderam e mesmo perdendo muita gente que lhe foi morta e ferida… se vieram retirando… atirando sempre sobre o inimigo… fomos seguindo a nossa retirada com muito trabalho por causa da Cavalaria que nos seguia sobre quem fizemos fogo; porém enfraquecendo cada vez mais não só pela gente que íamos perdendo ferida e morta, mas pelos muitos que se iam extraviando e fugindo e, nesta ordem de aperto, aproveitando todo o lugar pedregoso que mais nos pusesse ao abrigo da Cavalaria inimiga, vencemos légua e meia de terreno até Aldeia da Mata, aonde encontrando um pequeno bosque com um pequeno muro de pedra solta fiz entrar a Infantaria que me restasse e guarnecer o mesmo muro, tomando-o como parapeito… aonde nos defendemos, fazendo fogo sobre o inimigo por espaço de duas horas. (…)

Acabadas todas as nossas munições e ameaçados de ser passados a espada e atacados por todos os lados e até com a Artilharia adiante de nós, pronta a bater o bosque, eu capitulei a condição de bom trato à Tropa…”(4)

Este excerto faz parte de “Narração fiel e detalhada do Combate do dia 4 de Junho, entre as Tropas Portuguezas comandadas pelo Coronel D. Jozé Carcome Lobo, e Hespanholas pelo Marechal de Campo o Marquez de Mora junto a Vila de Flor da Roza. 1801” - Arquivo Histórico Militar – 1ª Divisão – 12ª Secção – Caixa nº 3 – nº 19.

 

 

E voltando à questão inicial, se as lendas têm um fundo de verdade, verifica-se, neste caso, haver correlação entre o relato de tradição oral, parcialmente sobre a forma lendária e a ocorrência factual dum combate no local referenciado. Combate que tendo-se iniciado em Flor da Rosa teve o seu epílogo à entrada de Aldeia da Mata.

 

Paralelamente ao desenrolar das operações de guerra, decorriam conversações para assinatura da Paz que seria datada de seis de Junho, pelo “Tratado de Badajoz”.

 

P.S. – Já após ter delineado este texto, tive a oportunidade de ler alguns excertos do livro “a nossa terra” do “senhor João”, João Guerreiro da Purificação, constante na bibliografia consultada. Na pág. 218, ao escrever sobre “As Alminhas Novas”, refere também a hipótese de que elas possam estar relacionadas com o combate supra mencionado. Recomendo vivamente a leitura deste livro, bem como das outras fontes referenciadas.

Digitalização livros combate.jpg

Vários outros documentos, inclusive espanhóis, referem a ocorrência deste combate, junto a Aldeia da Mata, de acordo com citações de alguns dos autores mencionados na Bibliografia. Tal ocorrência é pois um facto histórico comprovado.

 

Quanto à evocação deste “Combate” através das “Alminhas” pois que outra “guerra” e outro “combate” senão o referido, poderão evocar os mencionados monumentos singelos e peculiares?

Aliás essa evocação de acontecimentos trágicos, sejam eles de natureza individual ou coletiva, é uma das características das “Alminhas” espalhadas por todo o país, com especial incidência a Norte.

 

Curioso que, no Porto, na Ribeira, exista também um painel de “Alminhas”, permanentemente iluminado, junto à Ponte D. Luís, evocando um acontecimento trágico aí ocorrido durante a designada 2ª Invasão Francesa, quando a população da cidade, em fuga face à aproximação dos exércitos de Soult, em 1809, tentou atravessar o Rio Douro na designada “Ponte das Barcas”, que ruiu devido ao excesso de peso, tendo morrido milhares de pessoas. “Desastre da Ponte das Barcas” é assim conhecido.

Interessante a proximidade histórica destes dois acontecimentos: “Combate de Flor da Rosa”, 1801; “Desastre da Ponte das Barcas”, 1809. Ambos os acontecimentos integrados na designada “Guerra Peninsular”.

 

BIBLIOGRAFIA

 

- Arquivo Histórico Militar – 1ª Divisão – 12ª Secção – Caixa nº 3 – nº 19.

  “Narração fiel e detalhada do Combate do dia 4 de Junho, entre as Tropas Portuguezas comandadas pelo Coronel D. Jozé Carcome Lobo, e Hespanholas pelo Marechal de Campo o Marquez de Mora junto a Vila de Flor da Roza. 1801.”(4)

- NATÁRIO, Rui; As Grandes Batalhas da História de Portugal; 1ª edição, Barcarena, Marcador Editora, Março 2013.

- OLIVEIRA MARQUES, A. H.; História de Portugal, Vol II – Do Renascimento às Revoluções Liberais; 13ª edição, Lisboa, Editorial Presença, Jan. 1998.

- PURIFICAÇÃO, João Guerreiro da; A nossa terra;1ª edição, Lisboa; Há Cultura. Criação e Produção de Eventos Culturais, Lda / Associação de Amizade à Infância e Terceira Idade de Aldeia da Mata, 2000.

- RAMOS, R. et.al.; História de Portugal; 4ª edição, Lisboa, A Esfera dos Livros, Fev. 2010.

- VENTURA, António; Guerras e Campanhas Militares da História de Portugal, Guerra das Laranjas, 1801; 1ª edição, Lisboa, QuidNovi, 2008. (3)

- VENTURA, António; O Combate de Flor da Rosa – Conflito Luso-Espanhol de 1801; Lisboa, Edições Colibri, Junho 1996.

- VICENTE, António Pedro; Guerras e Campanhas Militares da História de Portugal, Guerra Peninsular 1801 / 1814; 1ª edição, Lisboa, QuidNovi, 2007. (2)

 

WEBGRAFIA

 RODRIGUES, Olinda Maria de Jesus; As Alminhas em Portugal e a Devolução da Memória, Estudo Recuperação e Conservação – Tese de Mestrado em Arte, Património e Teoria do Restauro. Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa, 2010. (1)

Wikipédia – Enciclopédia Livre  - http://pt.wikipédia.org.

http://www.arqnet.pt/exercito/laranja4.html 

 

 

Versões deste texto foram publicadas em:

Jornal “A Mensagem” nº 475, Janeiro 2014

Boletim Cultural nº 114 do Círculo Nacional D’Arte e Poesia, Fev. 2014

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