Há quem do Tejo só veja
o além porque é distância.
Mas quem de Além Tejo almeja
um sabor, uma fragrância,
estando aquém ou além verseja,
do Alentejo a substância.
Há quem do Tejo só veja
o além porque é distância.
Mas quem de Além Tejo almeja
um sabor, uma fragrância,
estando aquém ou além verseja,
do Alentejo a substância.
Iniciou-se, anteontem, dia 27 de Julho, 4ª feira, e vai continuar até 31 de Julho, a "11ª Mostra do Cinema Brasileiro”, no Fórum Municipal Romeu Correia, em Almada.
O filme de abertura: “Chatô – O Rei do Brasil”, de Guilherme Fontes, com Marco Ricca como protagonista, desempenhando o personagem de Francisco de Assis Chateaubriand Bandeira de Mello, “homem público” de grande influência no Brasil, nos anos quarenta a sessenta, do século XX.
“Personagem ” controverso, tal como o próprio filme e igualmente cruzando-se com outro homem político brasileiro, também suscetível de múltiplas controvérsias e contradições, sobre quem também já falei no blogue, de igual modo através de filme, da “ 10ª Mostra”: “Getúlio” Vargas.
(Remeto para os links que na wikipedia abordam sobre o filme e sobre o magnata da comunicação social. Ajudam-nos a entender melhor o enquadramento do enredo.)
Supostamente o filme reporta-nos para a vida deste truculento jornalista e empresário, construtor de um império comunicacional no Brasil e na América do Sul, iniciado ainda nos anos vinte, a partir de jornais, continuado com a rádio, logo que este meio de comunicação ganhou relevância, “Rádio Tupi” e prosseguido com a televisão, mal ela despontou, “TV Tupi”.
Empresário, político, mecenas, advogado, professor de direito, escritor, homem de múltiplas facetas, que em 1960 sofreu uma trombose, sem ter deixado de trabalhar até à morte, ocorrida em 1968.
O filme, de uma forma original e divertida, remete-nos para essa vida “excessiva”, melhor, “bem preenchida”, como se ele estivesse a ser julgado num programa televisivo em direto, numa hora de maior audiência, ("atingiu" 98% de share), denominado “O Julgamento do Século”.
Como Júri de Tribunal estão as outras personagens da sua vida: a primeira mulher, Maria Eudóxia (Letícia Sabatella); a primeira sogra, Zezé Polessa; a segunda mulher, Lola (Leandra Leal); a segunda sogra, Consuelo, (Eliane Giardini); Getúlio (Paulo Betti), …
Nesse suposto julgamento, transmitido ao vivo e em direto na TV, perpassam as suas vivências, segundo as perspetivas dos outros personagens e segundo o seu próprio crivo pessoal meio alucinado, de homem, sofrendo de trombose e prestes a falecer.
Aliás, a sua morte ocorreria no próprio final do filme, ou do programa (?). (Também de forma peculiar e desvairada, segundo a sua visão pessoal e já, ou sempre (?) tresloucada.)
O seu relacionamento com as mulheres, as diferentes visões dos seus desempenhos contraditórios nas diversas funções exercidas; a relação ambivalente com Getúlio Vargas, ora apoiando-o, ora denegrindo-o; a sua ação no mundo empresarial e político, chantageando, sacaneando, ameaçando; usando os meios comunicacionais de que dispunha, lançando boatos, atoardas, ataques, calúnias, para atingir os seus objetivos, os seus fins, sem olhar a meios.
Agindo de uma forma divertida, modos galhofeiros, sempre na busca do prazer e do seu interesse pessoal e na realização dos seus projetos e objetivos, pelo menos aparentemente é esta a perspetiva do realizador.
Em suma, se havia princípios, valores, atitudes, comportamentos, que ele menosprezava, achincalhava, sempre debochando, eram os da Ética.
Daí a ironia do filme, sujeitando-o a esse hipotético julgamento ao vivo e em direto, “reality show”, no seu próprio ambiente e modo de vida, os "media", já após a trombose, expondo-o à análise e valoração das pessoas com quem se envolveu na vida real e outras ficcionadas, caso da personagem Vivi Sampaio (Andréa Beltrão), de algum modo, a construção do realizador de uma suposta “mulher ideal”, melhor, “musa inspiradora”!
O personagem Carlos Rosemberg, (Gabriel Braga Nunes), inicialmente colaborador e aliado no mundo da comunicação social e posteriormente rival, também é ficcionado.
Os restantes personagens fizeram suposta e realmente parte da vida do protagonista.
O filme procura transmitir-nos essas variadas faces do personagem, num registo irónico, sarcástico, cómico, mesmo no lado trágico da doença e subsequente tetraplegia.
Muitas vezes galhofeiro, que supostamente esse terá sido o registo dominante na sua vida pessoal e pública!
O filme e o respetivo realizador, eles mesmos também objeto e sujeito de polémicas.
Trabalho que merece ser revisto, como forma de análise não só da(s) vida(s) do personagem, mas do próprio objeto artístico e documental (o filme).
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Algumas notas finais não sei se propositadas, se despropositadas, mas certamente contextualizadas:
1ª – O ar condicionado não estava a funcionar.
No Auditório Fernando Lopes Graça, onde foi projetado o filme, não se esteve propriamente mal, embora com algum desconforto. Mas no hall do Fórum estava-se péssimo.
Para além do óbvio e imediato, arranjar o sistema de refrigeração, o mediato:
- Quando é que os “nossos” arquitetos, engenheiros e urbanistas estruturam as nossas cidades e edifícios, de modo a minimizarem os efeitos térmicos?!
2ª – Nesta 11ª Mostra não houve direito a “brinde”?!
(…) (???)
Na 10ª Mostra houvera um agradabilíssimo, refrescante e refinado beberete!
E com estas notas termino que o calor já aperta novamente.
E ainda gostaria de visualizar mais alguns filmes da “Mostra”.
Que, frise-se, tem o apoio da Embaixada do Brasil.
Iniciou-se, anteontem, dia 22 de Julho 4ª feira, a 10ª Mostra de Cinema Brasileiro, no Auditório Fernando Lopes-Graça, no Fórum Romeu Correia, Almada.
Comemorando cem anos do cinema desse País.
Ainda bem que a série em transmissão na RTP2 não faz parte dos meus gostos, pois deste modo posso seguir esta Mostra, sem remorso de estar a perder alguma série que me interesse.
Na inauguração, foi projetado o filme: “Getúlio”, de 2014, do realizador João Jardim. Estrelando no protagonista, o astro das novelas brasileiras, Tony Ramos, desempenhando o papel do Presidente da República Brasileira, Getúlio Vargas. Praticamente como única personagem feminina, a artista Drica Moraes, no papel da filha do presidente, Alzira Vargas, e seu braço direito na presidência. Não resisto a referir que esta artista, não sendo habitualmente protagonista, é uma das minhas preferidas desde os tempos de Márcia, na novela “Chocolate com Pimenta”.
Vários outros artistas, nossos conhecidos das novelas, participam no elenco. E não se consegue deixar de, ao vê-los transfigurados, tentarmo-nos lembrar de onde, quando e de que novela… Também dois portugueses, Fernando Luís e José Raposo, pois o filme resulta duma co-produção.
A ação decorre num curto período de tempo, concretamente no mês de Agosto de 1954, desde o atentado ao jornalista da oposição, Carlos Lacerda, a cinco, em que morreu o seu guarda-costas, o major de Aeronáutica, Rubens Vaz; até ao suicídio de Getúlio, em vinte e quatro desse mês, quase há sessenta e um anos.
O espaço em que decorre a ação é a cidade do Rio de Janeiro, a capital brasileira na época. Brasília só seria inaugurada em 1960, por Kubitschek. E, a quase totalidade do enredo, desenrola-se no Palácio do Catete, sede da presidência.
Na sequência do atentado e num contexto político, em que o passado ditatorial do Presidente e dos métodos por ele usados são considerados charneira do seu modus operandi epocal, 1954, é este acusado como mandante do crime.
Lembramos que Getúlio Vargas exerceu a Presidência, de 1930 a 1945 e de 1951 a 1954.
Fui ver o filme não conhecendo praticamente nada da vida do protagonista, nem isso é necessário para a compreensão do mesmo, mas depois consultei e fica-se a perceber melhor o enquadramento.
Para quem quiser conhecer a trajetória de Getúlio, consultar:
Na sequência do atentado, um cerco se vai apertando à volta do Presidente que, diretamente não teve nada a ver com o assunto nem tinha consciência do mesmo, como ele referiu ignorava “estar sentado num poço de lama”. Mas, para todos os efeitos, a ordem para matar partiu de elementos da sua guarda pessoal de há dezenas de anos, sediados no próprio Palácio da Presidência.
Os apelos, os protestos, a pressão para que renunciasse ao cargo eram cada vez mais fortes e abrangendo setores sempre mais diversificados. A oposição parlamentar, os meios de comunicação: a imprensa e a rádio. A opinião pública, as classes detentoras do poder, as forças militares.
A Força Aérea Brasileira esteve desde o início no processo de investigação ao atentado e morte de um dos seus majores e os mandantes e autores foram sendo identificados e investigações foram realizadas no próprio Palácio.
O Presidente não estava diretamente implicado, mas era sobre ele que recaía o ónus do crime. E era sobre ele que incidia a pressão para renunciar, até entre elementos e chefias no próprio Governo.
E perante essas pressões externas ao indivíduo, presidente, homem, ser humano, Getúlio e a sua própria consciência, numa roda-viva alucinatória… as imagens dos candelabros do teto rodopiando são uma metáfora do que se passaria na sua cabeça… vai este delineando, tomando uma decisão, que, de algum modo, também dá a conhecer aos que o rodeiam.
Porque, renunciar não estava absolutamente nada nos seus planos.
O medo, o horror de ser preso e vilipendiado, conforme era atormentado nos seus pesadelos…
E, assim foi construindo a sua decisão sobre que deixou carta manuscrita:
“Deixo à sanha de meus inimigos, o legado da minha morte. (…)
Velho e cansado, preferi ir prestar contas ao Senhor…”
E na carta dactilografada: “Saio da vida para entrar na história.”
Decisão que executará na manhã do dia 24 de Agosto de 1954, tendo o seu suicídio um grande impacto em todo o Brasil, nomeadamente entre as classes mais pobres e trabalhadoras. Era considerado o “pai dos pobres”, embora os seus detratores também lhe chamassem o “pai dos ricos”…
E, no final, no filme são apresentadas imagens reais da época em que o “povão” vai passando aos ombros o féretro até ao avião…
Em que, posteriormente, seria levado para a sua terra natal, São Borja, no Rio Grande do Sul, onde seria sepultado.
E, estes são alguns comentários breves que posso tecer sobre este filme também com algum carácter documental.
No final da sessão foram os espetadores surpreendidos com uma agradável surpresa!
No hall do Fórum Romeu Correia dispunham de um simples mas refinado beberete, com algumas iguarias doces e salgadas, de que se serviram os presentes.
Gostaria de saber a respetiva origem, mas foi algo que ainda não consegui esclarecer.
Ontem voltei ao cinema.
Passou o filme “Trabalhar Cansa”, de Juliana Rojas e Marco Dutra. Sem estrelas conhecidas no elenco.
Os temas versam a atualidade: a vida de um casal quase nos quarenta, cuja mulher lança um negócio, mercearia de bairro, ramo que, em Portugal, com tantas grandes e médias superfícies, dificilmente daria… O marido, recentemente desempregado, numa procura desalentada de emprego, entre os gurus das novas modernidades e marketings enganosos…
Mas, estranhamente, perpassava em toda a narrativa algo de misterioso, de inexplicável, talvez fantasmagórico, que se situava no local das vendas, na mercearia…
E eu que não aprecio o género…
Mas sentia-se a presença de algo indefinível, real ou irreal, a que o ladrar sistemático de um cão, à noite, quando fechavam a loja, apelava… E para o que os acontecimentos no edifício iam encaminhando o enredo.
E, o que seria?!
Bem, peço desculpa, mas só vendo mesmo o filme. Que a crónica já vai longa…