Há quem do Tejo só veja
o além porque é distância.
Mas quem de Além Tejo almeja
um sabor, uma fragrância,
estando aquém ou além verseja,
do Alentejo a substância.
Há quem do Tejo só veja
o além porque é distância.
Mas quem de Além Tejo almeja
um sabor, uma fragrância,
estando aquém ou além verseja,
do Alentejo a substância.
“Sterling Cooper”: fusão ou confusão na “MacCann-Erickson”
E como se processou a integração dos quadros da antiga “Sterling” na "MacCann"?
Não foi nada fácil essa integração. Nessa fusão houve necessariamente muita confusão, principalmente nos quadros superiores. Imbuídos dum espírito de senhores dominantes numa empresa de pequenas dimensões, mas em que detinham um estatuto elevado, alguns dos sócios executivos tiveram dificuldade de integração ou não se integraram de todo.
Roger Sterling, principal acionista da firma com o seu próprio nome, que vendeu, não teria propriamente o objetivo de voltar a trabalhar. Reformou-se, que era esse o seu móbil. Gozar a vida. À grande e à francesa, daí ter juntado os trapinhos com uma canadense, que falava francês e com quem foi passear para a Cidade Luz, Paris!
Mas foi ele o elo de ligação entre a velha firma e a nova. Entre os quadros da “sua Sterling” e os executivos da “MacCann”. E essa interligação foi difícil de concretizar com alguns deles, ao ponto de Jim Hobbart, presidente da “MacCann”, o ter acusado de lhe ter vendido uma “maçã podre”.
Peggy Olson, redatora supervisora, vivenciou algumas dificuldades na sua passagem para a nova empresa, mais por questões inerentes ao funcionamento da empresa recetora. Que não dispunha, ou não disponibilizou desde logo, de um espaço próprio e específico para o seu trabalho, não lhe cedendo um escritório, nem os equipamentos necessários ao seu funcionamento. Essa ausência de ação traduzia, na ótica da profissional, uma falta de consideração pelas suas funções e estatuto, que ela tão arduamente conquistara, numa firma e num mundo sócio profissional liderado e dominado por homens. Finalmente ser-lhe-iam dadas as condições à sua cabal integração na nova empresa, conforme já abordámos no post anterior.
Até à sua transferência para a “MacCann”, foi permanecendo pelos escritórios da “Sterling”.
Aí lhe apareceria o próprio Roger, vindo da “MacCann”, angustiado e sequioso de álcool, que na nova empresa esse hábito não era cultivado, pelo menos à escala em que se abusava na sua firma, com o seu apelido batizada. Vasculhou o móvel-bar, mas não encontrou nada. Valeu-lhe Peggy, oferecendo uma garrafa de vermute, que compartilharam os dois. E foi vê-los, ele tocando piano e ela a andar de patins nos escritórios da “Sterling”, agora quase despidos de mobiliário, uns verdadeiros salões de baile e patinagem artística.
(E eu que julgava que só eu é que, por essa mesma época, finais de 60, inícios de 70, andava de bicicleta roda 28, em círculo, na cozinha da minha avóRosa! Mas não sob os efeitos de qualquer vermute!)
Pois sob esse efeito e de cigarro de lado na boca, conforme documenta a imagem seguinte, Peggy assim entrou triunfalmente, na nova empresa, senhora e dona do seu estatuto de mulher emancipada profissional e socialmente, demonstrando à saciedade e à sociedade conservadora da nova empresa, ser uma mulher livre e libertada! Uma menina pop!
Imbuída desse espírito, impregnada desses valores também, Joan, que aliás fora a mentora de Peggy, julgou que faria uma entrada triunfal, com passadeira vermelha, na MacCann. Mas saíram-lhe furados todos os cálculos, todas as conjeturas.
Mercê de um conjunto de estereótipos e preconceitos, a que não seria de todo alheia a sua condição de mulher, sobreposta ao seu visual de mulher fatal, esteve sujeita a um conjunto de equívocos, desde ser rebaixada a trabalhar às ordens de um jovem muito menos experiente e capaz, até pedir ajuda a um executivo, que achou que ela o fora convidar para uma escapadela de fim-de-semana, para na alcova conquistar estatuto profissional e mercês do patrão.
O confronto com o presidente da empresa não foi menos redentor. Pelo contrário. Não valeu qualquer argumento, muito menos supostas ameaças de sindicatos ou movimentos libertários ou denúncias nos jornais da cidade. Que ela ignorava as páginas de anúncios publicitários que a “MacCann” comprava diariamente nos principais diários nova-iorquinos.
Ontem, como hoje, os media têm Dono! Na altura, os principais meios de comunicação eram os jornais, pese embora o peso que a rádio também tinha e a crescente importância da televisão. O cinema também era importante, relativamente muito mais do que é agora.
Internet era ficção científica!
E Tudo Isto Tem Dono ou Donos!
Vale-nos atualmente e, apesar de tudo, a Internet. Um espaço de Liberdade!
Mas Joan não teve sorte nenhuma, mas também não cedeu nem se sujeitou a ser humilhada nem enquanto profissional nem na condição de mulher.
E preferiu deixar a empresa e o emprego, vendendo as suas ações e participação na firma por metade do preço, que foi isso que o presidente da MacCann, Jim Hobbart, lhe ofereceu. Cinquenta cêntimos, por cada dólar por ela investido.
E com esse dinheiro se foi e investiu na sua produtora de filmes industriais, de que também já falámos no epílogo.
Pete não só se integrou desde logo bem, que era “menino bem”, e sabia safar-se, como ainda ganhou emprego ainda melhor, de que também já falámos no respeitante ao episódio catorze e derradeiro.
Don, supostamente a “baleia branca” da “Sterling”, não saiu nem branca, nem preta, nem cinzenta, nem baleia. Saiu-lhes uma balela!
Na célebre reunião de diretores criativos, eles eram tantos e tão iguais, que Dan se confundiu.
Não se fundiu e fugiu.
Ver-se entre tantos e tão iguais, todos com mesuras simpáticas para com um palestrante chato, sempre a falar de um homem que todos conheciam, em quem todos pensavam, de que todos sabiam os hábitos, as atitudes e comportamentos, os costumes e que todos queriam convencer nos seus trabalhos publicitários, “o Homem Médio Americano”, que não era um, mas muitos milhões… fez Don devanear e vaguear nos topos dos arranha-céus da “Grande Maçã”, sair dessa reunião, não à procura de um “Homem Médio”, que não era apenas um, mas muitos milhões, mas à procura dele próprio, um único e apenas, na busca da sua identidade perdida, do seu original trocado.
E correu os “Estates”, na célebre “Estrada 66”, se não foi nessa foi noutra qualquer até lá ter chegado e no seu Cadillac, que na época tudo quanto se achava gente andava de Cadillac, e foi até à Califórnia frequentar um retiro espiritual na sua busca interior, que esperemos se tenha encontrado e achado.
E assim falamos, ou não, na integração/não integração na nova empresa, que muito fica por dizer, por contar, especular e questionar.
Talvez ainda fale de dois episódios verídicos, vividos na segunda metade da década de setenta, relacionados com os computadores, na época, “verdadeiros monstros”. Enormes! Tão só e apenas!
No episódio de ontem, a trama central da narrativa situou-se na fusão/incorporação da firma “Sterling Cooper” na “MacCann – Eryckson”.
Situação que se foi desvendando no decurso do episódio. Inicialmente a partir de um aparente não pagamento da renda do espaço ocupado pela “Sterling”, que depois se veio a saber, advir de os diretores da “MacCann” quererem transferir os serviços da “Sterling” para os escritórios da “MacCann”. Este facto começou por ser apenas do conhecimento dos cinco sócios executivos, Roger, Don, Pete, Joan e um quinto que não consegui identificar.
Tudo se estava a passar em relativo segredo, mas segredos destes são “o segredo da abelha”! Várias reuniões entre os sócios, entre estes e os representantes da “MacCann”; Pete que contou a Peggy; Peggy que contou a outro elemento criativo e sempre a mesma recomendação “não é para dizer, nem ao cônjuge nem ao melhor amigo… só te digo a ti, que és de confiança e sei que a tua boca é um túmulo!” Que isto dos segredos é como no “Príncipe das Orelhas de Burro”. O barbeiro que cortava o cabelo ao Príncipe não conseguindo guardar o segredo, confiou-o a um buraco que escavou e tapou com terra. Onde veio a nascer um canavial. E, crescidas as canas, o vento ao nelas passar, assobiava… “o Príncipe tem orelhas de burro… ” E fazia eco… E todo o reino veio a saber.
Assim aconteceu na empresa de publicidade.
Incorporar uma empresa em outra maior, já com uma estrutura formada, equivalia a dizer que iria haver dispensa de pessoal, para além da deslocação dos serviços.
Uma verdadeira bomba!
Esse receio foi primeiro dos executivos, ao saberem da situação. Alguns não queriam ir para as instalações da nova empresa. Foram equacionando alternativas, inclusive mudarem com a firma para as instalações que tinham na Califórnia! No outro lado do Continente, imagine-se, tal era o receio de, ao fundirem-se com a empresa maior, eles próprios se extinguirem nela… De serem devorados! Engolidos!
Mas também nem todos queriam ir apanhar banhos de sol na Califórnia, nem podiam, que tinham as suas vidas em NY.
Peggy, que não é sócia, logo que soube do segredo, tratou de contratar um angariador de trabalho, para lhe arranjar outra colocação, pois supostamente também iria perder o seu posto, por que ela tanto lutara, abdicando inclusive das funções da maternidade. Tinha imensas qualidades e experiência e vontade de trabalhar… mas tinha um handicap, não era licenciada. E os empregadores começam desde logo a recrutar nas Universidades…
As secretárias negras, quando souberam, que entretanto tudo se foi sabendo, que o vento foi propagando o boato, questionavam-se como iriam elas para a nova empresa, se uma delas nem sequer era primeira secretária, era apenas a segunda, que a primeira era a moça loura, como convinha ao status sócio profissional da firma. Será que Draper a iria levar com ele?! E na nova empresa iriam aceitá-la, a ela que era negra?!
A loura também veio a saber dos cochichos e interpelou diretamente o chefe, Don Draper. E este tranquilizou-a, que a levaria com ele.
Nesta altura já houvera a reunião final com o diretor da Mac Cann. E o diretor criativo e sócio da firma, Draper, sabia que podia dar esperanças à menina, sua segunda secretária!
Para essa reunião final os cinco executivos prepararam-se devidamente, estudando toda a sua carteira de clientes, tendo feito contactos com as empresas com que poderiam contar caso decidissem “abalar” para Los Angeles. E Draper, macho alfa e cérebro criativo, preparara uma apresentação com cartazes elucidativos, contando com a sua eloquência e sagacidade para defenderem a autonomia da Sterling.
Mas o diretor da MacCann surpreendeu-os completamente, dizendo que nada do que eles estavam a pensar fazia sentido, que tudo não passara de um teste à capacidade de resiliência da “Sterling”, que eles haviam ultrapassado, que eles não se anulariam na fusão e apontou-lhes as cinco empresas multinacionais de que disporiam como clientes, com um vasto mercado de publicidade para explorarem. Ou seja, só ficariam a ganhar. “Venceram! Parem de se debater!”
Eis as empresas, todas de grande potencial: Buick, marca premium de automóveis, ligada à General Motors; a Ortho Pharmaceutical, a dos contracetivos; Nabisco, National Biscuit Company, a dos biscoitos; Coca-Cola, a da célebre bebida, que se as pessoas tivessem conhecimento de que é feita, que é um verdadeiro lixo, ninguém a bebia… mas para o consumo a nível mundial dessa beberagem, muito contribuíram estes “Homens Loucos ”.
E haveria uma quinta, mas ou ele não a disse ou eu não a percebi.
Aparentemente cada um dos executivos homens ficaria com uma destas clientes. E que clientes!
A hipotética quinta empresa foi mesmo omissa?
Joan também se queixou que ele não lhe atribuiu nenhuma empresa… propositadamente, por ela ser mulher e por não a irem levar a sério na nova empresa, a ela que tanto tinha lutado para se afirmar dentro da Sterling, para além de ser o mulherão que é, que enche as vistas de qualquer um. Mas ela queria também afirmar-se como profissional, o que já conseguira na Sterling, sendo nomeadamente sócia, estatuto que não queria perder, que não tinha apenas um belo corpo de mulher, mas também era cabeça pensante.
E pensando nisso tudo, os executivos realizaram uma reunião com todo o pessoal da “Sterling Cooper” aonde oficializaram o que já toda a gente sabia, que iriam mudar-se para a MacCann – Erickson e que a transição iria ser o mais suave possível!
Coube a Roger Sterling fazer esse anúncio oficial, para isso tem o sobrenome na firma.
Paralelamente ocorreram cenas das vidas particulares de alguns personagens.
Joan, de vento-em-popa com o novo namoro, ainda vai à terra dos faraós, a recriar Cleópatra, com o seu Marco António.
A ex-mulher de Pete, agora divorciado, não conseguiu colocar a filha de ambos num reputado colégio onde os filhos família do ex-marido haviam estudado há gerações. Socorreu-se de Pete, para irem à escola privada a saber do sucedido. E foi um desfile de atitudes “bem”, ares e maneiras finas e requintadas, desde o trajar ao linguajar, que terminou numa cena de cow-boys, à boa maneira americana, em que Pete socou o diretor. Um ajuste de contas que já dura há três séculos, desde os primeiros colonos americanos.
Ficámos também a saber, que ela, ex-esposa, o disse, que na sua qualidade de divorciada, era assediada das mais diversas maneiras, quando tratava de qualquer assunto e essa condição era exposta.
Sem comentários!
Que os assuntos abordados no enredo dão pano para mangas. Permitem-nos constatar e comparar como era o Mundo em que vivíamos há meio século e as mudanças e alterações que vivenciámos nos mais diversos aspetos.
Sobre essa constatação ainda quero elaborar um “post” sobre duas ocorrências vividas…