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Aquém Tejo

Há quem do Tejo só veja o além porque é distância. Mas quem de Além Tejo almeja um sabor, uma fragrância, estando aquém ou além verseja, do Alentejo a substância.

Há quem do Tejo só veja o além porque é distância. Mas quem de Além Tejo almeja um sabor, uma fragrância, estando aquém ou além verseja, do Alentejo a substância.

“O Milagre das Rosas” (III - Epílogo)

E o que guardava a Rainha no regaço?!

Rosa rosa. Foto original. 2020.01. jpg

Pois. Finalmente, a Rainha Santa, Dona Isabel, resolveu-se a largar o avental, abrindo o regaço…

E o que saiu, que tão ciosamente a Rainha guardava?!

 

Pois… Nem pães, nem rosas.

O que caiu do regaço da Rainha foram… pasme-se, segure-se, Caro/a Leitor/a… centenas, milhares e milhares de raspadinhas. (Nem mais, nem menos!)

 

E a populaça, gritando “Milagre! Milagre!”, atirou-se aos papéis das raspadinhas. Que caíam do regaço da Rainha, esvoaçavam pela muralha e barbacã, e eram tantas e tantas, que até os cavaleiros desmontaram dos seus cavalos e se puseram a arrecadar os quadradinhos, alguns logo começaram a raspar, julgando que, na presença da Rainha Santa, teriam mais sorte e lhes calharia alguma premiação mais sortuda.

Enfim, um frenesim, a que só escaparam a Rainha e o Rei. Que até as damas também entraram no jogo.

(Bem, os cavalos também não entraram na jogatana!)

raspadinha. in. jogossantacasa.pt.jpg

E esta Caro/a Leitor/a é a estória vera, verdadeira, do celebérrimo “Milagre das Rosas”, adaptada aos tempos de hoje.

 

(Me perdoem os/as mais puristas destas coisas da História…)

 

Moral da estória: Deste modo, a Rainha Santa ajudou a Santa Casa!

 

(imagem raspadinha: in. jogossantacasa.pt)

 

“O Milagre das Rosas” (I)

E do regaço brotaram… rosas?

 

Isabel de Aragão, Rainha de Portugal, saía, com suas damas de companhia, do castelo, palácio onde vivia e estava estabelecida a corte. No séquito de mulheres que seguiam a rainha, nas suas visitas pela cidade, iam todas vestidas de burel penitencial, dada a época do ano, Semana Santa e o propósito da saída precária do confinamento: dar de comer aos pobres.

Aproveitavam a ausência do Rei que teria ido para as suas caçadas noturnas, não sabemos se de javalis, se também de javalinas.

Castelo. Óbidos. Foto original. 2019. 04. jpg

Mal se haviam deslocado da antecâmara do paço para o exterior, logo se ouve o tropel de vários cavaleiros, comandados pelo Rei.

Estancaram as montadas, na entrada do alcácer, frente às damas, que estremeceram num frémito de temor e prazer, face aos mancebos e homens de montaria do Rei. O próprio: Dom Dinis, Rei de Portugal e dos Algarves!

Só Isabel permaneceu impávida e serena, perante o marido, senhor e rei. O avental arrebanhado no regaço, onde levaria pães, carcaças, pães alentejanos, ou de rio maior, para distribuir pela pobreza das ruelas e becos que rodeavam o castelo, um emaranhado e intrincado labirinto de habitações, mal acabadas, aonde pensavam dirigir-se.

 

Aliás, todos os que pediam de ofício, pobres, mais ou menos necessitados, também aleijados ou doentes, de qualquer maleita ou defeito de fabrico ou de vida, já deambulavam nas redondezas da barbacã, onde abancavam, mal sabiam da presença da Rainha no paço. Sempre esperando a sua possível saída. A fama de santidade já a aureolava, circulando nas redes sociais da época. Boca a boca, o diz que disse, e assim por diante. Alguns pregões nas tabernas, beatas nas igrejas e capelas.

 

Como e porquê o Rei chegou antecipadamente, sem ser previsto, vai lá saber-se…

Como, já sabemos. Veio a cavalo.

Porquê?! Talvez algum mensageiro, desejoso de lhe agradar, tivesse comunicado com Dinis, avisando-o da saída do confinamento da Rainha. SMS também havia na época: pombos correios. Não sei se outros meios.

Certo, certo, é que ainda o sol mal despontara para as bandas de Espanha, e a Rainha se ausentava…e, Dinis, o Rei, a interpelava:

- Onde ides, Isabel, tão fresca e airosa, ainda o sol mal nasceu?!

- E que levais no regaço, tão atafulhado?!

 Logo, não apenas uma, mas duas perguntas, a exigirem resposta.

E que respondeu Isabel, a Rainha, a Dinis, o Rei?

(As respostas ficam para próximo postal.)

(Na localização da ação, deste micro conto, imagino o castelo de Estremoz ou o de Óbidos, ambos locais onde Dona Isabel esteve, quase de certeza. Óbidos foi prenda do Rei, como dote e em Estremoz foi onde morreu. Como não tenho nenhuma foto do Castelo de Estremoz e várias do de Óbidos, vai mais uma fotografia do Castelo de Óbidos, a ilustrar o postal.)

*******

o-milagre-das-rosas-ii

o-milagre-das-rosas-iii-epilogo

 

O Voo da Vida!

 

O voo da vida!

  

No seu regaço…

As rosas do milagre

Guardam o Pão da Vida

Espraiam o perfume inebriante

                                            dos sonhos.

 

As pombas da Paz

Pousam a memória

Dos dias claros da Infância

A serenidade dos momentos à lareira…

O lume a crepitar.

 

A voz maviosa das avós

contando estórias da dona Branca e dona Vintes…

o sabor doce dos dióspiros…

 

No seu colo sento o menino

        que fui

Traço o Destino

             que flui

Incessante sobre o mar.

 

O falcão que encerro em mim

Abrindo asas

Lança-se, em voo planado

Sobre os cumes nevados das montanhas…

 

Chegou a hora de partir!

 

Voar!

 

 

 

Escrito em 2006/2007.

Publicado em: X Antologia do C.N.A.P. - Círculo Nacional D’Arte e Poesia, 2009.

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