Trasladação / Encenação
Postar ou não Postar?!
Na passada 6ª feira, dia 3 de Julho, ocorreu um evento mediático, com divulgação em direto em dois canais generalistas de televisão, sobre o qual tenho vindo a hesitar se haveria ou não de publicar um post sobre o mesmo.
Várias ideias sobre o assunto, ao longo dos vários dias, mas protelando sempre o início da escrita.
Finalmente, ontem, tarde e a más horas, comecei a passar a texto algumas das ideias.
Decididamente, escrever num blogue é algo que, para mim, está a ser surpreendente.
Comecei com determinados propósitos que defini mentalmente como princípios para minha própria orientação. Princípios esses que se mantêm bem como as correspondentes estratégias de ação, mas há realidades que se vão sobrepondo, de modo que algumas das atividades que planeava executar têm sido um pouco relegadas para um plano mais secundário.
Outras temáticas têm prevalecido. Assuntos sobre os quais não projetara qualquer escrita, vão surgindo, mercê da interação que se estabelece neste mundo virtual, neste campo comunicacional.
Temas sobre que à partida definira para mim mesmo não escrever, tornam-se apetecíveis de comentar. Está neste caso a política. Decidira, à priori, que não me debruçaria sobre a política no sentido imediato do termo: “política tout court”. Porque acharia não ser essa a minha praia, haver tanta gente a fazê-lo, a saber como fazê-lo e a poder fazê-lo bem, tendo também as costas quentes para tal!
Também tem sido um espaço de aprendizagem.
Eu, para todos os efeitos e neste mundo dos blogues, sou perfeitamente um aprendiz e um outsider. E na comunicação ainda e muito mais.
Até no timing daquilo que escrevo. Sim, porque escrever sobre um evento ocorrido há oito dias é uma eternidade! Num mundo tão célere em termos de acontecimentos, com a rapidez e fluidez com que tudo acontece e desacontece, com tantas coisas e loisas a todo o momento na net, qualquer novidade sobre que se escreve perde rapidamente atualidade e sentido. E não é este precisamente o meu propósito! Gosto que haja algum sentido lógico naquilo que escrevo, não me limitar ao sensorial apenas, o que os olhos vêem e os ouvidos ouvem, mas que haja algo mais que o sentir, também o pensar sobre.
Daí que também o que escrevo tenha muitas vezes demasiada extensão para o contexto em que se insere.
Mas também se não fizesse assim, se não procedesse deste modo seria outra pessoa que não eu!
… ... ...
O assunto sobre o qual pretendo “postar” e que tenho vindo a hesitar, trata da trasladação de Eusébio, do Cemitério do Lumiar para o Panteão, em Alfama.
Não está em causa o mérito da pessoa em causa. Foi jogador emérito, futebolista insigne, astro rei na constelação de um naipe de jogadores excecionais, que brilharam nos anos sessenta do século XX, estrela da equipa dos “Magriços”, nome identitário de um Portugal à época repartido por cinco continentes e categorizado pela trilogia dos efes: Fado, Futebol e Fátima.
Eusébio foi uma bandeira que elevou o nome de Portugal, nesse tempo, nem sempre bem visto em vários fóruns internacionais. Consagrando-se como porta-estandarte de um País, pelos seus méritos e feitos no mundo futebolístico, uma estrela cintilante desse mundo desportivo, sem nunca ter assumido qualquer estatuto de vedeta, hoje tão intrínseco em qualquer profissional do ramo, sendo que nele o mais característico era precisamente a sua proverbial humildade.
Homenagear Eusébio, reconhecer o seu valor enquanto profissional de gabarito excecional é pois um ato normalmente aceite por qualquer cidadão português. Uma opinião unanimemente partilhada.
(Quem não chorou ou se emocionou com ele, quando ele chorou, no final daquele fatídico Inglaterra – Portugal, de 1966?!)
Mudar o seu corpo dum cemitério vulgar, onde repousam os restos mortais da maioria dos cidadãos, para um local onde estão depositados os que mais engrandeceram a Pátria, o Panteão, também se apresenta como uma ação perfeitamente integrada na normalidade. Ainda mais, Hoje, em que os deuses que povoam o panteão da atualidade são precisamente os do mundo do futebol, um verdadeiro Olimpo.
Então, porque será que sinto que esse ato pretensamente solene, a que compareceram representantes de todos os quadrantes, encerra em si mesmo uma grande encenação política e mediática?!
Haveria necessidade de andar a transportar o corpo, assim, daquele modo e daquela maneira, por uma Lisboa inteira, e ainda dar conhecimento em direto, com todos os pormenores possíveis, em duas televisões a todo o País?! Como se não fosse bem mais racional estruturar um trajeto direto entre os dois locais, com recurso a meios logísticos também usuais, sem aquele pretenso aparato e magnificência?! E nos locais próprios concretizar as cerimónias devidas, sem exageros barrocos e bacocos!
Supondo que fosse possível questionar a pessoa em causa, em vida, sobre o que o próprio acharia sobre o facto, o que acham que responderia?!
… … …
Pois!...
Mas é este o país que temos. Nem mais nem menos. Agora e, cada vez mais, um país de efes, agora já não e apenas identidade específica de um regime, como era considerado há quarenta anos, mas, pelo que vemos e ouvimos, matriz identitária de um País, de um Estado, de uma Nação!
Bem, e tenho dito, melhor, escrito!
Efecaritamata.