Uma viagem de comboio em 1990 (III)
Uma série de perguntas… Com ou sem respostas?
«Chover no Molhado» (III)
(…)
«Algumas pessoas comentavam que os dias de azar não são só as 6ªs feiras, mas como não sou de superstições, antes acredito que o futuro é fundamentalmente construído por nós próprios, gostaria de deixar algumas questões em aberto, à consideração de quem de direito e obrigação, sem pretensões a esgotar o assunto:
1 – Se, numa mesma viagem, há três avarias com três máquinas diferentes, será que estas, à saída das oficinas, estavam em condições para circulação?
2 – Ninguém prevê ou se preocupa com a eventualidade de possíveis acidentes a ocorrer, dadas as precárias condições de segurança em que se viaja? A memória é assim tão curta?
3 – Os tão propagandeados meios técnicos, a implantar nos comboios e que permitiriam uma resolução mais rápida de eventualidades como as descritas, continuam apenas a ser lembrados na altura dos acidentes? Depois são rapidamente esquecidos?
4 – Quando tanto se fala em investimento e progresso que, na Linha do Leste, em 1990, parece escrever-se RETROCESSO, será que ainda aqui veremos circular as máquinas a vapor? Estamos no Ano Europeu do Turismo!
5 – Será que teremos que passar a levar auscultadores para suportar o barulho da automotora? (Ou a CP passa a fornecê-los no acto de compra do bilhete?)
6.1. – Será que o objectivo das medidas recentemente tomadas (a extinção de certos ramais, acrescente-se também) pretende afastar os passageiros da utilização dos comboios como meio de transporte?
6.2. – Mas onde foram criadas alternativas válidas para muitas populações do Interior? Onde estão as boas estradas? Onde estão os bons meios de transporte rodoviários?
6.3. – Será de facto economicamente mais rentável, para o país, transportar passageiros por camioneta do que pelo comboio?
6.4. – Servindo-se das estruturas já existentes, não haverá modalidades de transporte ferroviário mais económicas do que as utilizadas?
(Supondo que será essa a razão principal da supressão de muitas das vias férreas.)
7 – Em suma, pretender-se-á, a longo prazo, uma ainda maior desertificação do Interior e um congestionamento e macrocefalia dos grandes centros urbanos?
8 – Será que o Interior está fatalmente destinado à florestação eucaliptal acompanhando a fuga das populações campesinas?
9 – Julgar-se-á que a actual divisão especializada das economias periféricas europeias e a respectiva superestrutura é eterna? Isto é, pensar-se-á que a estrutura da CEE é imutável e perene e que nós vamos ter sempre quem nos forneça muitos dos produtos que consumimos e injecções de capital financeiro para os adquirir?
Será que a nossa pasta de papel vai ser eternamente necessária nos países industrializados?!
Será que …? Será…?
Talvez sejam questões a que nós não mereçamos resposta… Talvez!»
Cova da Piedade / Lx, finais de Janeiro de 1990
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Estas foram as questões e considerações que formulei e enviei às Entidades com competências no assunto, juntamente com o texto descritivo da ocorrência.
(Valem o que valem, face ao contexto em que se inscrevem, ao tempo a que se reportam, e à importância de defender o Interior, sempre tão esquecido, há várias décadas.)
Enviei este texto completo, (sem negritos, estruturados para efeitos de blogue), para CP, para Assembleia da República, para Câmara Municipal de Portalegre, para Jornal “Fonte Nova”, para Jornal “Expresso”.
(Abordarei as respostas obtidas em próximo postal.
O/A Caro/a Leitor/a dirá que isto já parece um folhetim. E com razão, reconheço. Obrigado!)